Direto ao ponto
06:40 Fobias causam alterações na anatomia do cérebro
14:31 Manja do Assunto: Paulo Gustavo fala sobre fobia de avião
18:40 Minha Vó Tá Certa? Tratamento de choque de fobias
20:57 Ajuda Aqui! Relação entre fobias e sistema nervoso
23:52 Prêmio IgNobel: o ”pum” como defesa
Fobia não é frescura
Apresentadores: Jéssica Nakamura e Rodrigo Sampaio
(som de “bip”)
Rodrigo Sampaio: A Luísa, repórter aqui do Choque, estava contando uma vez para mim que ela foi entrar com a família inteira dela em um elevador, só que assustou uma moça que estava lá dentro, porque ela tem quatro irmãos e o espaço ia ficar um pouco apertado. Acabou que a mulher saiu e desceu da escada, dizendo que tinha claustrofobia.
Jéssica Nakamura: Parece com outra história que a Rayssa me contou semana passada. Ela estava falando de um menino, na faculdade dela, no Rio de Janeiro, que não andava de elevador de jeito nenhum. Então, ele subia e descia dez andares de escada todos os dias.
R: O brother aí deve ter as pernas torneadas.
J: Quem precisa de academia? (risos)
(VINHETA: Trilha sonora acompanhada de locução: “Você está ouvindo Choque da Uva, a ciência no cotidiano!” Em seguida, começa a trilha sonora do filme “O Exorcista”, que possui marcas de suspense)
J: Todo mundo já ouviu falar de fobia. Tem as mais comuns, como a claustrofobia, que é o medo de ficar em lugares muito fechados ou apertados, e a acrofobia, que é o medo de altura.
R: Essa aí é exatamente a que meu pai tem. Ele morre de medo de altura, eu nem sabia que tinha esse nome. Mas tem algumas até bem diferentes, como a hidrofobia, que é o medo excessivo de água, e a catisofobia, que é o medo de sentar.
J: Até super-heróis têm fobias. O Batman, por exemplo, desde criança, morria de medo de morcego. Tem até aquela cena – não é Rodrigo? – daquele filme que você gosta, que ele cai naquele poço cheio de morcego, que é justamente a maior fobia dele.
R: É, o Batman Begins.
(Entra trecho do filme Batman Begins, com som de morcegos atacando Bruce Wayne quando criança)
J: E você sabe qual o nome disso, o medo de morcego, Rodrigo?
R: Não faço a menor ideia.
J: O nome disso é chiroptophobia, e é por causa disso que ele escolhe ser o “homem morcego”, justamente para fazer seus inimigos sentirem o mesmo medo que ele sentia quando criança.
R: Caramba! E tem também o Indiana Jones, que, apesar de passar por aventuras incríveis e ter sobrevivido às situações mais improváveis, morre de medo de cobra.
(Entra fala de Indiana Jones no filme Os Caçadores da Arca Perdida: “Snakes… Why’d it have to be snakes?” – Tradução: Cobras, por que tinha que ser cobras?”)
R: E você sabe qual o nome disso, Jéssica?
J: Não faço a menor ideia, Rodrigo. Pode falar!
R: Esse medo de cobras se chama ofidiofobia.
J: Pois, então. Existem vários tipos de fobia por aí. Mas você conhece a ciência por trás desse transtorno?
R: Eu sou Rodrigo Sampaio.
J: Eu sou Jéssica Nakamura.
R: E este é o Choque da Uva, o novo podcast que vai falar sobre ciência de uma maneira diferente. Nós também estamos nas redes sociais: é só procurar @choquedauvapod no Twitter, Instagram, YouTube e Facebook.
J: Você aí que está ouvindo a gente. Você conhece alguém que tem fobia? Ou será que esse alguém é você mesmo? Histórias como a do Batman ou do Indiana Jones, lá do início do nosso episódio, são mais comuns do que a gente imagina.
R: Sem falar que tem fobia de tudo que é coisa.
J: De onde nasce uma fobia? Qual a diferença entre fobia e medo? O que acontece com nosso corpo quando estamos diante de algo que nos causa pavor?
R: A Marina, que é uma das repórteres aqui do Choque, por exemplo, tem tripofobia, que é o medo de coisas com buraquinhos.
J: Inclusive, a Marina está aqui do lado, aqui no estúdio. Vamos chamá-la rapidinho? Marina, chega aí.
R: Chega aí, Marina.
Marina Aragão (repórter): Oi, gente!
J: Marina, conta para a gente. O que é exatamente essa sua tripofobia?
Marina Aragão: É pessoal, eu tenho fobia de qualquer coisa que tenha vários buraquinhos ou saliências. Por exemplo, Rodrigo, o que você sente quando vê um formigueiro, um coral ou uma pessoa com catapora?
R: Eu não sinto nada.
Marina Aragão: Pois é. Isso me dá muita agonia, nojo, coceira e, às vezes, vontade de vomitar. Meu nível de estresse fica muito alto. É uma sensação muito desagradável. E são coisas muito aleatórias até: eu chego a ter fobia de alguns tipos de chuveiro.
R: Nossa, que pesado!
Marina Aragão: E é algo superinvoluntário. Eu não consigo controlar. E é complicado porque tem muita gente que acha isso engraçado e fica mostrando objetos e imagens só para me zoar. Só que fobia não é frescura!
R: Pô, que vacilo.
J: E você já pensou em ir a algum psicólogo?
Marina Aragão: Pior que não. E eu acho que é de família, porque minha mãe também tem tripofobia. A gente já falou de ir a algum especialista, não fui porque isso nunca chegou a me prejudicar, até porque eu não estou exposta a essa fobia o tempo todo. A gente vai deixando, vai levando… mas sabemos que estamos vulneráveis a qualquer coisa do tipo.
J: Bom, Marina, obrigada por compartilhar isso com a gente. Mas fica aqui que esse episódio do Choque é para você.
Marina Aragão: Obrigada! Vou precisar.
(Entra música “Medo”, da Pitty)
Medo corre entre os meus dedos, entre os meus dedos./ Eu lambo os dedos e saboreio os meus próprios medos
J: O problema é que difícil quantificar quantas pessoas têm fobias no Brasil, já que não existe um levantamento oficial sobre o assunto. Mas um relatório publicado pela Organização Mundial da Saúde, a OMS, pode dar uma pista da gravidade desse problema.
R: Nesse estudo, a OMS aponta que o Brasil é o País do mundo com o maior número de pessoas com algum tipo de transtorno. Chega a representar 7,5% da população, ou seja, mais de 18 milhões de brasileiros. Vale lembrar que, além das fobias, também estão incluídas nessa taxa as pessoas que sofrem com crises de ansiedade, fobia social, ataques de pânico e TOC, que é o transtorno obsessivo compulsivo. Doenças do século 21 que dão uma noção de que não é um problema isolado.
J: Mas a origem desses medos e fobias ainda é incerta. Existem medos que surgem depois de traumas, como alguém que quase morreu afogado e hoje quer distância de mares e piscinas. Mas também há aqueles que não têm origem definida. Alguns especialistas atribuem esses a processos evolutivos. Ou seja, esses medos seriam adaptações desenvolvidas na época dos nossos antepassados para proteger e garantir a sobrevivência da espécie. No período Paleolítico, por exemplo, os seres humanos evitavam cobras, leões e outros animais por conta do perigo que representavam. E esses medos se mantêm até hoje, mesmo que agora a gente viva em cidades grandes.
R: Inclusive o medo de rato. Se a gente parar para pensar, o ser humano é um dos poucos animais que têm medo desses roedores, justamente por associá-los à imagem de transmissor de doenças.
J: Inclusive teve uma pesquisa feita na Universidade de Emory, em Atlanta, nos Estados Unidos, que descobriu que um trauma pode causar mudanças genéticas no DNA. A gente muitas vezes acaba carregando medos dos nossos antepassados e a gente nem imagina o motivo.
R: E uma coisa que também é importante para entender esse tema é a diferença entre medo e fobia. A gente conversou com especialistas e a definição que eles deram foi de que o medo é uma emoção normal tanto para os seres humanos quanto para os animais, muito ligada ao instinto de sobrevivência. É justamente o que evita que a gente faça besteiras e cuide da nossa autopreservação.
J: Já a fobia é justamente um tipo de transtorno de ansiedade, quando esse medo natural ultrapassa os limites ou é desproporcional ao que causa. Está mais ligado a um fenômeno irracional, porque a pessoa não teria motivos para ter tanto medo assim.
R: Vamos entender como nasce uma fobia com nossa mente nessas horas? Nós conversamos com o Saulo Nader. Ele é neurologista do Hospital Israelita Albert Einstein.
(Entra som de suspense)
J: Quando a pessoa tem alguma fobia, acontece alguma alteração no corpo dela?
Saulo Nader: Para entender o que acontece no cérebro de uma pessoa, neurologicamente, tenho de explicar sobre uma área do cérebro chamada amígdala (não tem nada a ver com a amígdala que tem na garganta, que a gente opera quando criança). É uma região muito vinculada ao controle das emoções e do nosso comportamento. E a amídala é a área-chave do cérebro quando a gente fala de medo, de receio. Porque é essa área do cérebro que vai estar ativada quando a pessoa tem uma resposta de medo, de angústia, de perigo.
R: Então, quando ela é ativada é que a gente começa a sentir formigamento, tremores, dor de barriga, o coração acelerado…
Saulo Nader: São reações autonômicas que essa área do cérebro, a amígdala, desencadeia através de reflexos neurológicos. Várias outras áreas do cérebro, correlacionadas às emoções, vão atuar nessa hora do medo.
J: Mas e a amígdala? O que exatamente ela faz?
Saulo Nader: Um processo que a gente chama de habituação neurológica. O que é isso? Poxa, tenho medo de escuro quando sou criança. Mas eu começo a perceber, ao longo do tempo, que sou exposto ao escuro e que nada de mais acontece. Então, essa área do cérebro vai reprogramando, se reinventando, e, com isso, consigo interpretar que aquela situação usual não oferece perigo e, por isso, não tenho fobia ou medo. Nas pessoas que sofrem com a fobia, que é a patologia, esse processo de habituação neurológica não acontece. A pessoa começa, em situações habituais, a ter o desencadeamento da amígdala como se fosse uma situação de perigo, sendo que, na verdade, não é.
J: Hmmm, entendi.
Saulo Nader: Outra área do cérebro vinculada é a do cíngulo, que é uma área comportamental, que interliga o nosso córtex, do funcionamento motor, com a área límbica, que comanda as emoções do cérebro. Tem até uma pesquisa que mostra que a pessoa com fobia tem o afinamento do cíngulo anterior do córtex…
R: Ooopa, acho que agora é hora do nosso…
(VINHETA: Som de disco voltando, seguido de narração: “Momento Faraday!”)
R: Professor, o que é esse cíngulo anterior do córtex? Traduz esse nome complicado para a gente.
Saulo Nader: Esquecendo nomes complicados: eu tenho áreas do cérebro que comandam comportamento e emoção, essas áreas do cérebro são aquelas que identificam o medo e que conseguem ao longo do tempo, num processo de habituação, se adaptar a eles para que eu não identifique tudo como medo e, nas pessoas com fobia, esse processo falha e a pessoa tem o medo exagerado, que é fobia, que é patológico.
R: Valeu pela explicação , doutor! Pô, sinistro isso acontecer no cérebro da gente.
J: Realmente, a gente não tem noção do que acontece muitas vezes. Mas eu tenho outra dúvida: há alguma forma de tratar ou controlar uma fobia? Quando eu sei que preciso procurar um médico?
R: Boa pergunta, Jéssica. E, para responder isso, a gente chamou a psiquiatra Maria Fernanda Caliani.
(Entra som de suspense)
R: Então, vamos lá: primeiro, quando a gente precisa tratar uma fobia?
Maria Fernanda Caliani: O que vai determinar quando uma fobia tem de ser tratada ou não é o grau de prejuízos na vida da pessoa. Algumas vezes, a pessoa apresenta a fobia, mas ela até consegue manter as atividades, mesmo ali com a fobia junto. Mas, depois que ela termina aquela atividade, ela sente como se tivesse sido atropelada por um trem. Ela está extremamente esgotada e cansada. Em outras situações, por exemplo, ela tem um prejuízo funcional e a pessoa falta em reuniões ou em aulas, por conta do medo daquela situação.
J: Quando a pessoa decide fazer o tratamento, como isso é feito?
Maria Fernanda: O tratamento envolve principalmente a terapia e, no caso das fobias, a mais indicada é a terapia cognitivo-comportamental, porque ali a gente trabalha uma dessensibilização sistemática. O que é isso? A gente constrói uma lista de situações que causam desconforto para aquela pessoa e organiza de forma hierárquica. Então, nós vamos iniciar com a situação menos desconfortável e, aí, vai haver um enfrentamento gradual das situações que provocam ansiedade, visando diminuir aos poucos o desconforto que essa situação ocasiona na pessoa.
R: Tem algum exemplo de como é feito esse tratamento?
Maria Fernanda: Se uma pessoa tem fobia de dirigir, primeiro, ela vai ligar o carro em casa acompanhada do marido, de alguma pessoa que ela tem segurança, na garagem. Depois, ela só vai dar uma voltinha, dentro da garagem mesmo. Depois, ela vai sair e vai até a esquina e vai voltar. Depois, ela vai dar uma volta no quarteirão. Depois, ela vai andar um pouco mais. Depois, ela vai passar por todos esses passos, mas aí sem ter aquela pessoa de segurança do lado. A gente vai aumentando o grau da exposição. Quando a medicação se faz necessária, nós utilizamos os antidepressivos para controlar o grau de ansiedade e a atividade que aparece quando a pessoa é exposta ao estímulo. Dos antidepressivos, nós escolhemos o serotoninérgicos, porque eles interferem na produção de serotonina, para diminuir esses desconfortos físicos, frente às ameaças.
R: É interessante que a medicação é usada mais como um suporte. A Maria Fernanda tava explicando pra gente que esses remédios agem no sistema nervoso para normalizar o fluxo de neurotransmissores. Eles saem de um neurônio, atravessam a sinapse, que é o espaço entre dois neurônios, e ativam os receptores do neurônio seguinte. Esse processo todo serve para regular humor, ritmo cardíaco, sensibilidade à dor e um monte de outras coisas. Mesmo assim, a dessensibilização que a doutora explicou é o mais importante no tratamento da fobia.
J: Mas é possível ficar 100% curado da fobia depois desse tratamento?
Maria Fernanda: Como a fobia é um transtorno crônico, em que a causa não é totalmente elucidada, nós falamos no tratamento para controlar os sintomas, e aí a resposta, o sucesso terapêutico vai depender muito de cada caso e de cada organismo. Então, a gente não consegue generalizar isso. É muito variável e depende de cada um.
R: Saquei. Valeu, Maria Fernanda! E depois das explicações, está na hora da gente bater um papo com alguém que já sentiu na pele sobre o que a gente tá falando.
(VINHETA: Trilha sonora acompanhada de locução: “Manja do assunto!”, seguida de som de avião decolando)
R: No nosso quadro Manja do Assunto, em que conversamos com uma pessoa muito entendida sobre o tema, a gente bateu um papo superdivertido com um cara que é gente finíssima.
J: É o querido do Paulo Gustavo, ator e comediante que está na televisão, no cinema, no teatro, em tudo que é canto. Ele também é do Rio, lá da sua terra, né Rodrigo?
R: Meu querido Rio de Janeiro!
J: Ele estava na casa dele, no Rio, e tirou um tempinho pra falar com a nossa repórter Rayssa Motta.
R: E aí, Rayssa, conta para a gente!
Rayssa Motta: Oi, Rodrigo. Oi, Jéssica. Oi, gente. O Paulo tem aerofobia, que é o medo de andar de avião.
(Entra trecho da música “Medo de Avião II”, de Belchior)
Foi por medo de avião que eu segurei pela primeira vez a tua mão
Rayssa Motta: Oi, Paulo, conta para a gente.
Paulo Gustavo: Oi, gente. Eu tive muito medo de avião na minha vida. Mas eu fui superando ao longo dos anos com o trabalho. O trabalho foi mais forte. Eu tenho de trabalhar e portanto não posso me dar ao luxo de ter nenhuma fobia e ficar em casa. (risos) Principalmente agora com criança recém-nascida. Agora, eu tenho mais medo, mas tem outro significado. Eu tenho medo de acontecer alguma coisa comigo e deixar meus filhos, muito pequenininhos ainda. Vou bater na madeira que isola. 1, 2, 3, isola.
J: Ah, mas não deve existir uma pessoa sequer que não tenha medo quando acontece uma turbulência, né?
Paulo Gustavo: Claro, quando dá uma megaturbulência, não tem nenhum ser humano que não tenha medo, mas já entrei nesse lugar do coletivo, tenho medo quando todo mundo tem. No início, eu ficava com a mão suando, eu olhava para a aeromoça para ver se ela estava com cara de que o avião vai cair. Eu já peguei algumas vezes para o exterior, que o avião trepidou muito, e não tinha uma coisa para pousar, no meio do oceano. Durante muito tempo, me segurei na ideia de que, se estivesse no mar, tipo ponte aérea. Eu ficava pensando: se der uma merda, vai pousar na água e não explode. Mas depois comecei a conhecer pilotos (e descobri que) pousar na água é muito mais difícil. Numa terra mais irregular, explode. Enfim, não tem como pousar. Pousar é no aeroporto. Já tive muito medo, mas agora não tenho mais.
Rayssa Motta: E você já perdeu algum trabalho por causa dessa fobia de andar de avião?
Paulo Gustavo: Não. Minto, já perdi um trabalho, sim. Perdi um trabalho, uma vez, num lugar muito longe. Tinha de descer em Brasília e pegar um jatinho de hélice para descer não sei onde. Eu disse: “Esquece, prefiro perder esse trabalho”. Eu trabalho muito, viajo o Brasil inteiro com show e não tenho mais problema com isso. Esse medo me rendeu muitas piadas e um bloco enorme no Hiperativo, que ficou oito anos em cartaz. É isso. A gente tem de usar o perrengue e transformar em coisa boa. Transformei em arte.
Rayssa Motta: Obrigado, Paulo. Valeu por ceder um pouquinho do seu tempo para falar com o Choque!
Paulo Gustavo: Beijo grande para vocês! Fiz questão de vir aqui com carinho dar meu depoimento sobre esse assunto. Beijo grande!
(Entra a trilha sonora do quadro “Minha Vó tá Certa?”)
J: E chegou o momento do nosso quadro Minha Vó Tá Certa?, em que derrubamos (ou não) os mitos das nossas queridas avós. Nossa convidada de hoje é a Laura Granado, psicóloga, psicanalista e professora da Universidade São Judas.
R: E hoje o que a gente quer saber é o seguinte: tem muita vó por aí que é “sem tempo, irmão”. Minha vó dizia que fobia era frescura.
J: Um exemplo: a fobia de palhaços, que é a coulrofobia. As doces senhorinhas podem dizer “para de frescura, olha só como ele não faz nada”, forçando a pessoa que tem fobia a encarar o palhaço. Esse tratamento de choque, de “você tem que encarar seu medo”, é indicado, Laura?
Laura Granado: Então, o tratamento de choque não é indicado, porque se você expõe a pessoa, de uma maneira traumática, ao objeto fóbico, você provoca uma reação nela que aumenta o grau de ansiedade vinculado ao objeto. Expor de maneira forçada a pessoa ao objeto que dá medo não é algo indicado, isso prejudicaria, pioraria a fobia.
J: E, por exemplo, com os pais. Como eles podem ajudar as crianças a lidarem com medos e fobias? Como saber qual é a hora de procurar auxílio médico quando as crianças têm um medo excessivo de alguma coisa?
Laura Granado: Como ajudar uma pessoa, né? Identificando que tem esse medo excessivo, pode levar a um psicoterapeuta. Quando você percebe que aquilo está provocando um prejuízo à vida da pessoa, um sofrimento excessivo, está prejudicando o trabalho, a escola. Então, deve levar a um psicoterapeuta. E ter esse cuidado porque muitas vezes as pessoas falam “poxa esse medo não tem nada a ver”, isso é frescura. Seja o que for, há o julgamento daquele medo. Expor de maneira traumática a pessoa ao objeto de medo não é desejável. Então, é desejável que tenha um manejo cuidadoso com a pessoa e que se possa realmente levá-la a fazer um tratamento efetivo, que seria com um psicoterapeuta, uma pessoa formada e capacitada para isso.
J: Boa, muito obrigada!
(VINHETA: Trilha sonora acompanhada de locução: “Ajuda aqui!”)
J: E no nosso quadro para os vestibulandos de plantão, pedimos para o professor de Biologia Thiago Madrigrano, do Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo, mandar um áudio para a gente contando como esse tema das fobias pode cair na prova.
R: Professor, é contigo!
Thiago Madrigano: Oi, pessoal, tudo bom? Aqui é o Thiago, professor de Biologia. Quando a gente pensa em fobia, a gente geralmente associa àquele medo que foge do natural e é disparado por certo fatores externos, que podem ser, por exemplo, alguns animais ou até excesso de pessoas, ambientes abertos. Varia muito de pessoa para pessoa. Da perspectiva biológica, aparentemente existe um fundo fisiológico para esse tipo de comportamento e ele está muito atrelado ao sistema nervoso. Reforçando, então, o paralelo entre fobias e os vestibulares, um pouco da anatomia do sistema nervoso é interessante de ser abordado. Mas mais do que isso: a conexão entre os neurônios, todo esse processo de comunicação entre frontal e amígdalas, o hipocampo ou mesmo com as glândulas que estão distantes dessas áreas, como a glândula suprarrenal, essa comunicação se dá por meio de impulsos nervosos, que tecnicamente a gente chama de potencial de ação. Através da integração das sinapses, que é quando um neurônio efetivamente se comunica com outro neurônio. Do ponto de vista um pouco mais técnico, o impulso nervoso conduz a informação ao longo de um neurônio, enquanto a sinapse é o mecanismo em que um neurônio informa o próximo neurônio daquilo que está acontecendo no nosso corpo. Então, a fobia pode servir como pano de fundo para entender a tanto a anatomia geral do sistema nervoso quanto a fisiologia por trás da comunicação entre os neurônios. Essa comunicação é tão importante que boa parte dos remédios que trabalham em cima de transtornos de ansiedade e fobia é de drogas que atuam nessa comunicação. Pode ser através do aumento da liberação de certos neurotransmissores ou pela redução da liberação dessas substâncias. A ideia das substâncias que atuam no tratamento deste tipo de transtorno é sempre reequilibrar a essa comunicação, que, por algum motivo, saiu da normalidade.
R: Estamos chegando ao fim do nosso Choque, mas ainda temos tempo para a nossa premiação favorita…
(VINHETA: Trilha sonora acompanhada de locução: “Com vocês, Prêmio IgNobel”)
R: E o momento IgNobel de hoje vai para a psicóloga Mara Sidoli, por um artigo publicado em 1996, no Journal of Analytical Psychology, uma revista super-reconhecida de psicologia e psicanálise.
J: Vejam só: a pesquisa analisou o caso de um garoto americano chamado Peter, que sofreu diversos traumas ao longo da infância. Por causa disso, o menino desenvolveu o hábito de peidar como forma de se defender em situações de extremo desconforto e pavor.
R: O artigo também foi registrado em um dos livros da analista, que possui um nome bastante apropriado: Quando o Corpo Fala. Na obra, ela conta que imitava os sons de peido para se aproximar da criança, mas isso a deixava ainda mais inibida e irritada. Por que será, né?
J: A autora conta ainda que, durante as sessões de terapia, ela se sentia “ignorada, humilhada e esquecida” pelo Peter. A criança costumava agir de forma agressiva com ela. Mas graças a duas pelúcias, um coelhinho cor-de-rosa e um Garfield, aquele gato laranja dos quadrinhos, a psicóloga conseguiu aos poucos com que o menino se tornasse mais sociável e passasse “mostrar sua dor, em vez de seus puns”.
R: Eu estou até emocionado.
J: Rodrigo, tem até um filme que tem a ver com isso, por incrível que pareça. Em inglês, o filme se chama Thunderpants, e em português, Pum – Emissão Impossível.
R: Trocadilho sensacional. Não podia ser melhor (risos).
J: Ah, títulos em português (risos).
(Entra abertura do filme Pum – Emissão Impossível)
Numa distribuição Imagem Filmes, Pum – Emissão Impossível
J: Esse título incrível conta, inclusive, com a participação do ator Rupert Grint, nosso querido Rony do Harry Potter.
R: A história é de um menino chamado Patrick que solta muito pum. Ele só tem um amigo, Allan, que é um pequeno gênio sem olfato.
J: É por isso que ele não se incomoda com o cheiro do colega.
R: Para ajudar, Allan consegue criar uma roupa antigases para que o amigo tenha uma vida normal. A invenção dá tão certo que a NASA convoca a dupla para participar de um projeto aeroespacial. Isso é muito provável de acontecer. (risos)
J: É, tem coisas que só ouvindo pra acreditar mesmo…
(Trilha sonora do filme Pum – Emissão Impossível, com vários sons de pum. Em seguida, trilha sonora de encerramento do podcast Choque da Uva)
R: E este foi o Choque da Uva, o novo podcast de ciência do Estadão que explica tudo o que cê tá a fim de saber.
J: Eu sou Jéssica Nakamura.
R: E eu sou Rodrigo Sampaio.
J: O roteiro é de Luísa Laval e Marina Aragão.
R: A produção é de André Marinho, Heloísa Scognamiglio, Luísa Laval, Marina Aragão e Rayssa Motta.
J: A edição de som ficou por conta do Felipe Goldenberg.
R: Aproveita e siga a gente no Twitter, no Facebook, no YouTube e no Instagram: somos o @choquedauvapod.
J: Este programa é feito pela 30° turma do Curso Estado de Jornalismo, os focas do Estadão.
R: Valeu, tchau, tchau!
J: Tchau, até a próxima!
(Encerramento da trilha sonora)