Direto ao ponto

01:12 Qual é o impacto da geração de criptomoedas?

07:52 Entenda o que é blockchain

25:15 Minha Vó Tá Certa? Mitos e verdades sobre criptomoedas

27:50 Manja do Assunto: Narcisa Tamborindeguy dá opinão sobre bitcoin

30:00 Ajuda Aqui! Qual a probabilidade de encontrar um bitcoin?

32:32 Prêmio IgNobel: Impressões trilionárias de dinheiro

Quanta energia gasta com bitcoin?
Apresentadores: Carla Menezes e Diego Kerber

*Toca um bip para indicar uma conversa de bastidores.

Carla Menezes: Menino, um dia desses eu fui na farmácia e me deparei com um aviso: “ACEITAMOS BITCOIN”. E eu fiquei: como assim?
Diego Kerber: (risos) Queria eu ter bitcoin para comprar esse negócio, né?
Carla: O pior é que eu vi que essas moedas gastam a maior energia!
D: Ué, mas não é digital?
C: E computador não gasta energia, não é?
D: Tá, você tem um ponto.

TRILHA PADRÃO DO PROGRAMA: “Você está ouvindo: Choque da Uva, a ciência no cotidiano. 

C: Eu sou Carla Menezes/
D: E eu sou Diego Kerber/
C: E este é o Choque da Uva, o novo podcast que vai falar sobre ciência de uma maneira diferente. Nós também estamos nas redes sociais: é só procurar @choquedauvapod com d mudo no Twitter, Instagram, Facebook e Youtube.

INICIA TRILHA com sons de moedas caindo e caixas registradoras abrindo. 

C: É, Diego… 2020 tá aí. Tudo bem que os carros voadores ainda não são realidade como previam os filmes de antigamente. Mas, se tem uma coisa que parece até ter saído desses filmes futuristas são as criptomoedas.
D: Verdade, Carla! E tenho certeza de que muita gente já até ouviu falar de bitcoin, mineração, blockchain. Mas será que a gente realmente está por dentro do que significa tudo isso?
C: E mais. Você já parou para pensar o tanto de ciência por trás disso tudo? Parece doido. Mas tem de sobra.
D: Pois é. Se interessou? Então, prepara aí o bloco de notas do celular porque com certeza você vai querer anotar um monte de coisa para sair na frente da galera. 
C: É. A primeira delas é que bitcoin é só uma das mais de 2.500 criptomoedas existentes atualmente. Tem a JesusCoin, a MarsCoin, que, atenção, arrecada fundos para colonizar Marte. Sim! Isso mesmo. Para colonizar Marte. Nem o presidente dos Estados Unidos escapou. Sim, gente, existe a TrumpCoin! Em 2018, até o Ronaldinho Gaúcho criou sua criptomoeda, a RS Coin. 
D: É tanto nome e são nomes tão criativos. Mas falando em Ronaldinho Gaúcho, tem jogador de futebol investindo em criptomoeda. O Messi é um caso.
C: Tem o pessoal da música, também. O 50 Cent, acredite, com esse nome, investiu em criptomoedas, chegou a ir à falência e, depois, descobriu que as criptomoedas nas quais ele havia investido anteriormente tinham rendido e ele não estava tão falido assim. 
D: Bom, é aí que se percebe que esse assunto é muito maior do que a gente imagina. Inclusive, tem muita gente que já está chamando esse cenário atual de criptoeconomia. 
C: E como toda novidade que se populariza, o tema já tem música

(Áudio da música Bitcoin, da Banda Luxúria)
O meu amor não é virtual, / mas estou bebendo em bitcoin. / É transação internacional,/ o mundo inteiro vai girar o capital

C: Tem boato, tem teoria da conspiração e, claro, muitos pontos positivos e negativos.

(Trechos de reportagens sobre o assunto)
A Receita Federal apertou o cerco aos investidores de criptomoedas como o bitcoin. A partir de agosto, as transações precisam ser informadas. Segundo as investigações, os suspeitos recebiam dinheiro de clientes e prometiam lucros enormes no mercado de criptomoedas.

D: Isso mesmo. Então, só para você entender. Nesse episódio, a gente vai explicar o que são as criptomoedas, como elas são fabricadas e qual é a tecnologia por trás disso tudo. 
C: E, mais, o que você precisa saber se quiser trabalhar nessa área no futuro, quais impactos as criptomoedas causam ao meio ambiente ou à nossa rotina e muito mais. Olha, Diego, vou confessar que o tema é complicado mesmo. Até por isso que a gente conversou com um monte de gente que está estudando o assunto e atuando na área. Que é uma área nova e, por isso, se torna ainda mais complicado. Mas eu posso garantir… Depois que a gente entende, é igual a andar de bicicleta. A gente não esquece mais. Até leva uma queda de vez em quando, mas a gente não esquece mais.
D: Exato, mas a gente ainda precisa aprender a pedalar, né, Carla? Bom, para começar a esquentar a conversa, as criptomoedas nada mais são do que moedas virtuais. É como se você tivesse, na sua carteira, um novo tipo de dinheiro, que você pode usar para comprar o que quiser. A diferença é que ele não é físico, é um código único, ou seja, não existe nenhum igual a ele, que você pode transferir para outra pessoa de forma digital. Mas não é para confundir com cartão de crédito ou de débito, hein?
C: É. Porque tanto o cartão de crédito quanto o de débito precisam de um intermediário para validar a transferência, que é o banco. As criptomoedas são diferentes, porque não têm esse intermediário. É exatamente como se uma pessoa desse uma moeda de um real para outra. Inclusive, estou precisando. Quem quiser me dar uma moeda de R$ 1.
D: (risos) E essa foi uma das vantagens que fez o Vinícius Barbosa se aventurar nas criptomoedas. Mas quem é esse cara? Ele é estudante de engenharia mecânica, tem 22 anos, a minha idade, e conheceu o bitcoin em 2015. Escuta aí!

Vinícius Barbosa, estudante de Engenharia Mecânica: O que me mantém no bitcoin é a ideia de descentralização. A ideia de tirar um poder do banco que ele tinha até então de controlar todas as taxas todas as transações e agora você pode enviar dinheiro para uma pessoa nos Estados Unidos do outro lado do mundo e chegar no mesmo dia sem pagar taxas absurdas. Isso é maravilhoso.

D: E o valor dessas moedas? Porque são tão caras? Há duas explicações: a mais longa e a mais curta. Mas, como esse é um podcast de ciência e não uma aula, vou focar na mais resumida, beleza? Vamos pegar um exemplo do mundo real. Sabe o ouro, por exemplo? Então, ele só é valioso porque o mercado disse que ele é. 
C: Para explicar melhor, pensa que ele é um minério que é extraído da natureza, mas que a gente achou valioso o suficiente para ser moeda de troca ou até mesmo para estar nas mais belas joias. Imagina aí uma joia daquelas bem chiques com um bitcoin pendurado. Sendo que ele não é físico. Ele é digital. Então, não dá para imaginar muito. Seja porque ele é escasso, porque é resistente ou simplesmente porque é bonito mesmo. É o que a gente chama de valor de mercado.
D: Exatamente. A mesma coisa acontece com o bitcoin e todas as outras criptomoedas. Elas foram criadas e a gente começou a dar mais ou menos valor a elas, porque são mais escassas, porque têm uma tecnologia segura e vários outros fatores que nos fazem dizer que um bitcoin pode ser suficiente para comprar uma capinha de celular, um iPhone ou até a própria Apple, dependendo de quão valorizado ele é pelas pessoas. Por exemplo, em fevereiro de 2010, R$100 compravam mil bitcoins. Hoje, para comprar esses mesmos mil bitcoins seria necessário desembolsar R$ 31 milhões!
C: Meu Deus! Eu ia até dizer que esses R$100 podiam ser meus… mas, em 2010, duvido que eu tivesse essa grana fácil assim. Mas, voltando para entender como tudo isso é possível, a gente precisa falar da tecnologia por trás dessas moedas virtuais. É o que chamamos de blockchain, também conhecido como protocolo da confiança. 

VINHETA DO QUADRO MOMENTO FARADAY.
(O Momento Faraday é um quadro que explica alguma expressão pouco conhecida pelo público).

D: Isso. É essa tecnologia aí que garante que as pessoas tenham controle de tudo. Quer um exemplo superprático? Sabe aquele caderninho de anotar fiado? Aquele que você pede para o dono da venda pendurar? Ou para a moça da cantina botar na conta? Então, isso é blockchain!
C: Ou seja, o blockchain é um sistema criado para registrar informação, da mesma forma que o caderninho que anota o fiado. O Rocelo Lopes é empresário do setor de criptoeconomia e explicou para a gente de uma forma simples, com um exemplo da mãe dele. 

Rocelo Lopes, empresário: A minha mãe tem 83 anos e me deu uma aula de blockchain. Como assim uma aula de blockchain? Na época que a minha mãe tinha 14 anos, ela trabalhava na venda do meu avô, lá no interior do Ceará. E sabe como é que ela registrava as compras das pessoas? Numa caderneta, onde ela colocava a data, o produto que a pessoa comprou e o valor. E ia somando isso durante um mês, um ano inteiro. Quando terminava a safra de algodão, eles levavam aquele monte de quilo de algodão para o meu avô e a minha mãe abatia de tudo aquilo que compraram. É exatamente assim que o blockchain funciona. Bom, o blockchain, para fazer uma análise bem direta, é como uma planilha de Excel, de Google Docs. Vamos pensar que é uma planilha onde a gente tem ali várias colunas onde a gente registra toda a transação. Então, se o Rocelo vai transferir para Mariana alguma quantidade de bitcoin, a operação está registrada numa blockchain, numa tabela, vamos falar assim. E lá está o que? A data, a quantidade, o seu endereço, que é um endereço bem grandão. Em vez de ser um nome, não, está um endereço. Em vez de ser um número de conta, é um monte de caracteres, de letras e de números. Onde ele está registrado que a minha carteira transferiu para tua carteira 0,0001 bitcoin. Então, o blockchain nada mais é do que uma planilha que registra entradas e saídas. Eu posso apagar? De jeito nenhum. Eu posso falsificar? De jeito nenhum. Por quê? Cada minerador tem uma cópia. Então, não adianta nada apagar a cópia daqui porque vai haver milhões de cópias por aí. Cada criptomoeda tem seu próprio blockchain. 

C: Isso é importante porque, como a gente já explicou, a moeda é virtual e não tem um banco controlando. Então, é preciso deixar isso registrado de alguma forma. E também é bacana porque essa tecnologia foi criada para as criptomoedas, mas pode ter aplicações diversas.
D: Exato. O pesquisador Percival Lucena, da IBM, explicou isso. 

Percival Lucena, pesquisador da IBM: Existem redes de blocos – blockchains – que são utilizadas para rastrear alimentos, tem redes de blockchains que são utilizadas para rastrear contêineres, tem redes que são utilizadas para fazer integração com cartórios no Brasil. Lá fora, há rede de blocos conectando hospitais. Então, como são redes, elas têm os mais diversos usos.

D: Exatamente. Essa tecnologia é tão legal que num futuro pode até substituir toda aquela papelada de cartório quando você for registrar um nascimento ou algo do tipo. Pode ser usado, por exemplo, para arquivar toda a minha ficha clínica.
C: E a minha, no caso, é enorme pois sou hipocondríaca e toda semana estou no médico. Imagina só? Saber quais remédios, exames ou passagens pela emergência eu tive em toda minha a vida?
D: Mas, voltando às criptomoedas, todo esse papo começou lá em 2008, quando um programador japonês, que ficou conhecido pelo pseudônimo de Satoshi Nakamoto, criou esse código e em 2009 minerou o primeiro bloco de bitcoin, que o pessoal apelidou de Gênesis. E tá certo, né? Porque, afinal, realmente foi o começo de tudo. E sabe o que é mais maluco? O bitcoin já nasceu com data de validade determinada. É que esse código já previa uma quantidade limitada tanto de produção diária quanto total.
C: Vamos lá para um exemplo prático. Vamos supor que seu pai ou sua mãe dão para você uma mesada de R$ 20. Você tem 10 anos de idade e recebe essa mesada de R$ 20. Conforme o passar do tempo, conforme você vai ficando mais velho, vai mudando, vai entrando no mercado de trabalho, você vai receber cada vez menos dinheiro dos seus pais. É mais ou menos assim que funciona o bitcoin.
D: Tá, mas agora vamos voltar para o bitcoin. Em 2019, por exemplo, é possível fabricar 1.800 bitcoins novos por dia no mundo inteiro. Mas essa quantidade cai pela metade a cada quatro anos — como se fosse a Copa do Mundo. Em 2020, serão 900. E assim sucessivamente. Até o ano de 2140, quando a produção vai chegar na última divisão possível do bitcoin, de oito casas decimais.
C: Isso. Tem até um nome pra esse um centavo de bitcoin. É o satoshi, que na prática é 0,00000001.
D: E lembra que a gente falou de ser limitada? É que, ao todo, só existirão 21 milhões de bitcoins no mundo. Atualmente, já circulam 18 milhões. Então, é como se o seu pai ou sua mãe falassem: até você chegar na faculdade, vou dar uma mesada, mas você só vai ter R$ 10 mil para receber nesses anos. Então, se você pedir mais dinheiro eu vou tirar desse montante e, se acabar, acabou. Resumindo, agora só restam mais 3 milhões de bitcoins disponíveis para serem minerados. E esse é justamente um dos motivos para a moeda ser tão valiosa. Tem gente que costuma dizer que achar um bitcoin hoje é quase como ganhar na loteria, já que atualmente são milhares de mineradores ao redor do mundo tentando a sorte.
C: Tá, mas aí você pode estar pensando: minerador? Como aqueles que trabalham nas minas de ouro? Não! Está um pouco longe disso. Lembra que a gente disse que isso aqui parece coisa de ficção científica? Pois é!
D: Exato. No bitcoin, o minerador nada mais é do que um computador muito potente, que chega a custar cerca de US$ 3 mil. Ele trabalha 24 horas por dia, todos os dias, com a missão de registrar os dados de transações na blockchain.
C: É, só que encontrar a combinação matemática para encaixar os blocos é mais difícil do que ganhar na loteria. Mas quem consegue fazer isso primeiro recebe a recompensa de 12,5 bitcoins. Escute só a explicação do Rocelo:

Rocelo Lopes, empresário: O minerador está lá para verificar se a Mariana tem aquela quantidade para enviar para o José. Se ela tem, ótimo. O saldo do José é atualizado e a Mariana passou a ter aquela quantidade a menos.

D: E é daqui que vem o termo fazendas de bitcoin ou, simplesmente, mineradoras.

Rocelo Lopes, empresário: As pessoas acham que é como um datacenter daqueles que a gente vê nos filmes. Tudo bonitinho. Não. É bem feio. Bastante calor. Na mineradora, a gente tem mais seguranças do que técnicos porque na teoria a gente é a Casa da Moeda. A gente está gerando dinheiro lá dentro, né? Então, para quem assistiu a esses filmes e séries, como La Casa de Papel e esses outros que têm por aí, a gente é a Casa da Moeda, a gente tá imprimindo dinheiro. 

C: E aí fica a dica para quem quer trabalhar com isso: uma mineradora vai precisar de gente para dar manutenção, para dar a limpeza nas máquinas, para cuidar do firewall, para fazer atualização das máquinas… e por aí vai.
D: Mas esses supercomputadores são tão potentes que esquentam muito, mas muito mesmo, viu? O Rocelo comparou essas supermáquinas com secadores de cabelo de 1.600 watts de potência.

Rocelo Lopes, empresário: Esquenta igual, sopra na mesma temperatura. Aquele ar quente é constante. Na nossa mineradora no Paraguai, a temperatura ambiente vai a 60ºC. E a gente tem de tentar baixar a temperatura para algo como 45ºC ou 50ºC. É extremamente quente. Por isso, as principais mineradoras do mundo estão em países frios como o Canadá, a Islândia, a Estônia e a parte mais fria da China. Porque é muita energia que a gente precisa usar e realmente esquenta muito.

(Áudio da música “Welcome To The Blockchain”)
We’re now standing on the precipice of a global revolution/ Of politics, economics, and government/ Welcome to the blockchain

C: Daí você deve estar se perguntando: “Mas o Paraguai não é tão frio assim?”. Verdade. Mas é que por lá a energia é bem mais barata do que no Brasil, o que é um fator determinante para quem quer empreender na mineração de bitcoin aqui no País. Para explicar isso, o Percival Lucena, pesquisador da IBM, ajudou a gente:

Percival Lucena, pesquisador da IBM: No caso das criptomoedas, você tem de manter uma rede que seja uma rede aberta, que qualquer pessoa possa participar. E como você não tem como verificar se a pessoa que está participando é honesta ou não, para você manter as transações corretas, você tem de exigir algum tipo de comprometimento dessas pessoas que mantêm a rede. No caso do bitcoin, especificamente, ele exige que você resolva um problema criptográfico, que é o que a gente chama de cálculo do no once, que basicamente é você descobrir um número aleatório que você adiciona àquele bloco de transações e, quando você for aplicar uma função matemática, vai gerar um certo número de zeros. Isso, no caso do bitcoin, é um problema muito pesado, que é mantido artificialmente justamente para você garantir que os participantes da rede estão se comprometendo em manter as transações corretas. E esse cálculo em si é o que exige uma grande quantidade de eletricidade, porque você tem de fazer uma quantidade enorme de tentativas até descobrir o número certo.

D: Só para comparar, no Paraguai, um quilowatt custa para os fabricantes de bitcoin cerca de quatro centavos de dólar. No Brasil, o preço da energia mais barata é sete vezes maior, chegando a quase 28 centavos de dólar.
C: É. Para quem, como o Rocelo Lopes, tem cerca de 6.000 mineradores ligados 24 horas por dia, isso é um fator superdeterminante.
D: Mas é justamente nesse ponto que muita gente acendeu o alerta para a produção de bitcoin.
C: O Edilson Aguiar, por exemplo, é mestrando do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da USP e está estudando de perto esses impactos.
D: Existem vários estudos que comparam os gastos energéticos do bitcoin. Um deles, que o próprio Edilson mencionou durante nossa conversa, foi publicado em 2018 no Journal Research in Social Science.
C: Esse artigo comparou a energia gasta para fazer uma compra com cartão de crédito ou débito a uma compra com dois tipos de criptomoedas, o bitcoin e a ethereum.
D: Com os cartões convencionais, o gasto é de 0,01kw/h. Com o bitcoin, de acordo com o estudo, o consumo seria de 200 kw/h. Uma baita diferença, que consome atualmente cerca de 0,14% do suprimento global de energia.
C: A Universidade de Cambridge criou até uma maneira de medir isso. É o Índice de Consumo de Eletricidade de Cambridge Bitcoin
D: É! Lá no site do projeto é possível fazer várias comparações. Uma que eu acho legal de destacar é que se o bitcoin fosse um país e a gente comparasse o consumo dele com todos os outros 193 países, ele estaria na 40ª posição, com um gasto energético anual de 71 terawats. 
C: Ou seja, o consumo anual de energia para produzir bitcoin é maior que do gasto anual de 153 países, como Venezuela, Colômbia, Chile e Áustria. Para se ter uma dimensão melhor, o Brasil está em 8º no ranking, com um consumo anual de cerca de 509 terawats de energia.
D: Ah! Outra comparação bacana que a gente pode destacar aqui é que a quantidade anual de eletricidade consumida por aqueles dispositivos que ficam sempre no stand-by com TVs, computadores, microondas… Só nos Estados Unidos, essa quantidade toda é suficiente para manter a rede bitcoin ativa por três anos.
C: Mas o Edilson explica o por que de tanta preocupação:

Edilson Aguiar, mestrando do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da USP: O que isso pode ocasionar também? Uma escassez de energia elétrica se aumentar o número de mineradores, se aumentar o número de máquinas fazendo esse processo de mineração. Então, esse gasto de energia pode ser prejudicial para o meio ambiente porque será preciso ter mais usinas para a geração de energia e elas também prejudicam o meio ambiente. Então, têm todos esses fatores que estão ligados, relacionados à tecnologia do bitcoin.

D: Olha, mas temos boas notícias! Tem uma turma de brasileiros dedicada a em tornar esse processo muito mais ecológico e sustentável.
C: Por exemplo, a gente encontrou o José Damico, que é fundador da SciCrop, uma empresa de tecnologia para o agronegócio. Ele está estudando uma forma de  aproveitar o bagaço da cana-de-açúcar na produção de criptomoedas. É que, quando reaproveitada, essa sobra da produção de etanol ou de açúcar vira biomassa e pode ser usada para a produção de energia elétrica.
D: Exatamente. Hoje em dia essa energia já é vendida ou reaproveitada na produção da própria usina. Mas onde a criptomoeda entra na jogada?
C: Calma que eu explico! Essas usinas de cana-de-açúcar atualmente têm uma necessidade de tecnologia muito alta para análises, comércio… Vários desses serviços são digitais e acabavam sendo comercializados a partir de criptomoedas. 

José Damico, fundador da SciCrop: A ideia era a seguinte: ‘Por que você não paga um montante desses serviços usando criptomoedas?’. Ao mesmo tempo, você tem uma capacidade de mineração a um custo baixo energético e, com isso, você reduz seus custos de TI utilizando criptomoeda e ainda minerando ela, ou seja, aumentando um pouco o seu ativo de criptomoeda na sua própria casa, usando a energia que você gera. 

D: O estudo dele ainda está em fase de testes e não foi aplicado em nenhuma usina. Mas já é um começo, né?
C: Pois é. Ele ainda explicou que energias eólica, hidrelétrica e biomassa, são realmente potenciais para o uso em blockchain, que tornaria o consumo mais sustentável.

José Damico, fundador da SciCrop: Energia eólica, hidrelétrica, biomassa… Essas energias renováveis são realmente potenciais para o uso em blockchain e dá para você seguir. E a gente também precisa desmistificar e colocar também, quando fazermos as comparações, qual é de fato o custo que os outros modelos bancários estão utilizando. É importante lembrar que os modelos bancários estão hoje entre os que mais utilizam data centers, ou seja, eles já têm uma pegada de carbono muito alta.

(Áudio da música Bitcoins)
Não saio de casa com menos de 10k no bolso / Investi em Bitcoins e tripliquei o torro / MC, empresário, milionário bem novo

C: Olha, uma coisa é certa: tem muita oportunidade de fazer ciência nessa tal de criptoeconomia. Dá para criar ideias de como usar blockchain, dá para aprender a minerar, dá para criar criar sua própria moeda.
D: E, claro, dá para achar várias soluções para os impactos dessa nova área. Se você gosta desse lado mais tecnológico da ciência, não vai faltar área para estudar. E aí o Rocelo, que é empresário e produtor de criptomoedas, deixou algumas dicas. 

Rocelo Lopes, empresário: O campo de trabalho é muito grande. O que precisa? Estudar bastante. Pesquisar bastante sobre esse assunto e, de preferência, entender em inglês. É muito importante falar em inglês. Para entender essa tecnologia, vai ter de entender de finanças porque não adianta só entender a parte da tecnologia. Tem de entender matemática. Bastante matemática. É complexo? É! Vai valer a pena? Daqui a 20 anos eu te digo.

C: Vinte anos! Olha só! Então, será mesmo que esse é o futuro, Rocelo?

Rocelo Lopes, empresário: Eu acho que é um complemento com uma nova economia. É a mesma coisa a gente falar assim… teve um momento de transição. A gente primeiro usava troca, permuta de coisas. Então, eu trocava ovos por peixe até que um dia eu tinha ovos, mas eu não queria peixe. Eu queria outra coisa. E aí criaram a moeda de ouro. Um dia alguém foi lá e inventou um tal de papel, mas que tinha ouro guardado e tinha aquele papel que valia. E eles conviveram. Depois, aquele papel que tinha uma condição monetária virou um cheque, onde eu escrevia o valor e as pessoas confiavam. Mais ou menos na década de 1990, veio o pedaço de plástico. A gente vai ver uma coexistência durante um tempo. Criptomoeda é a moeda do futuro? Sem dúvida. É a moeda da internet? Sem dúvida. O bitcoin é a moeda do futuro? Não. Ele não é rápido, não é eficiente para o que é internet precisa. Quando comparado com dinheiro, coitado do dinheiro. Coitado das transações bancárias. Mas ainda não serve para ser o dinheiro do futuro. A  atualização ainda é muito cara, ainda tem uma série de coisas para ser evoluídas. O banco e essa nova economia vão conviver juntos? Sem dúvida. O banco vai acabar? De forma nenhuma. Eu acho que o banco vai usar essa nova tecnologia da criptomoeda e eu tenho quase certeza de que, um dia, a gente vai dizer o seguinte: ‘Olha, no banco tal eu tenho conta em real, conta em dólar, conta em euro e conta em cripto.

VINHETA DO QUADRO MINHA VÓ TÁ CERTA?

C: É, Diego, eu não sei a sua avó, mas a minha não está lá muito informada sobre bitcoin, criptomoeda ou blockchain. Mas tenho certeza de que se essa conversa chegar ao ouvido dela, minha avó vai vir logo com aquele papo: “Iiiiii, que bitcoin que nada. Fica inventando moda. Prefiro mesmo é guardar meu dinheiro debaixo do colchão”.
D: Carla, eu consigo até imaginar a minha vó falando isso. É muito fala de vó isso. E é por isso que o quadro Minha Vó Tá Certa? de hoje pediu ajuda do professor Ricardo Rochman. Atualmente, ele é professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e está por dentro dos mitos e das verdades sobre as criptomoedas.
C:  Vamos começar, então. Ricardo, minha vó está certa ao dizer que é melhor deixar o dinheiro debaixo do colchão?

Ricardo Rochman, professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas: Se você está na dúvida se investe em bitcoin ou deixa o dinheiro embaixo do colchão, o bitcoin ainda não tem uma correlação muito grande com outras moedas, como o dólar ou euro, para nós deixarmos debaixo do colchão. Por isso, a recomendação, se estiver nessa dúvida, é aplicar em títulos do governo, por exemplo. Você vai estar ganhando juros e tem uma segurança total do seu rendimento com baixa volatilidade. 

D: Boa! Já que a gente está aqui, vamos aproveitar para tirar outras dúvidas. Muita gente diz que bitcoin é ilegal. É verdade?

Ricardo Rochman, professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas: O bitcoin de ilegal não tem nada. Muito pelo contrário. A própria Receita Federal do Brasil reconhece o bitcoin como ativo que deve ser declarado anualmente no Imposto de Renda. Inclusive, a partir deste ano, todas as operações feitas com bitcoin, a partir de determinado valor, devem ser declaradas mensalmente à Receita Federal.

C: Bitcoin é pirâmide?

Ricardo Rochman, professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas: O bitcoin não é uma pirâmide. No entanto, muitos malfeitores ou até fraudadores fazem o marketing de pirâmides usando o nome do bitcoin justamente prometendo ganhos muito fáceis e rápidos. Isso não existe no mercado financeiro. Por isso, antes de fazer qualquer operação com bitcoin, investigue. Qual é a exchange? Qual é o site que está fazendo a operação? E não acredite em milagres.

VINHETA DO QUADRO MANJA DO ASSUNTO

(Áudio da música Funk da Narcisa)
O meu nome é Narcisa (adoro) / O meu nome é Narcisa (adoro) / Ai, que loucura! / Ai, que absurdo! / Ai, que badalo! / Eike Batista! / O meu nome é Narcisa / O meu nome é Narcisa / Ai, que loucura! / Ai, que absurdo! / Ai, que badalo! / Eike Batista!

C: Olha, se tem uma pessoa que — diferente de mim — entende de riqueza e não está nada preocupada com milagres na conta bancária é a nossa entrevistada de hoje, a Narcisa Tamborindeguy. Conta mais, Marina.

Marina Cardoso, repórter: Pois é! A gente conseguiu conversar com a socialite carioca. A Narcisa ficou conhecida por suas participações como repórter no programa do Amaury Júnior e também quando participou, lá em 2012, do programa Mulheres Ricas, da Band.
Narcisa Tamborindeguy, socialite carioca: Eu não entendo muito de bitcoin. Eu gosto de dólar, de euro, de reais. De dinheiro que eu já conheço, de moedas minhas. E esse bitcoin parece uma ficha de um cassino. É uma ficha de um cassino. É para quem sabe jogar muito bem que pode jogar com bitcoin.
M: E olha o recado dela para quem tá querendo dicas de onde investir o seu dinheiro.
Narcisa Tamborindeguy, socialite carioca: É bom investir. Eu gosto de investir em CDB, em moedas nossas, em dólares, em fundos imobiliários.

VINHETA DO QUADRO AJUDA AQUI!

(Áudio da paródia da música-tema de Pokémon)
I wanna pay with the very best /Like no one ever has/

C: Como o próprio Rocelo Lopes tinha dito, a probabilidade de acertar esse código está caindo cada vez mais. O professor de Matemática  Antonio Godoy, do cursinho da FEA da USP, explica como isso pode ser cobrado.

Antonio Godoy, professor de Matemática do cursinho da FEA da USP: A criação das criptomoedas está associada a um processo que é chamado de mineração. Esse processo de mineração está associado a um conceito matemático que é a parte de probabilidades. O primeiro ponto a falar é o seguinte: O que é uma probabilidade? A probabilidade é sempre uma relação, é uma fração, entre o número de eventos que interessam e o número de eventos possíveis. Então, se eu falo para vocês: Qual é a chance de, ao jogar um dado, sair o número dois? O resultado que me interessa é apenas um dos seis possíveis. Então, a probabilidade é uma em seis chances. O tema probabilidade cai com bastante frequência tanto na primeira fase quanto na segunda fase dos vestibulares. No caso da Fuvest, em 2019, você tinha lá uma urna com bolas azuis e brancas e você ia retirar de duas em duas. A questão perguntava qual que era a chance de acontecer de as duas bolas serem da mesma cor. Então, você tem de verificar qual é a chance de tudo o que pode acontecer, qual é o número de eventos possíveis e qual é a chance de acontecer aquilo que te interessa. Ainda na Fuvest, só que em 2018, era um torneio de xadrez e eles perguntaram, na primeira parte da questão, qual era o número de emparelhamentos possíveis num torneio com duas vezes N candidatos. Ou seja, quantas partidas iniciais você poderia ter. E, na segunda parte da questão, eles perguntavam: Se você tivesse 12 jogadores, 6 homens e 6 mulheres, qual seria a chance do emparelhamento ser só partidas entre homens e partidas entre mulheres na primeira rodada. Então, o conceito essencial é probabilidade. É o número de eventos que interessam dividido pelo número de eventos possíveis de acontecer. Lógico que essa fração vai dar um número entre zero e um, que é o resultado esperado. Um grande abraço e boa sorte no vestibular!

VINHETA DO QUADRO PRÊMIO IGNOBEL

C: Antes de a gente apresentar o Prêmio Ignobel de hoje, eu acho válido a gente pedir desculpas de antemão para os economistas ou aspirantes a economistas que estão ouvindo.
D: Isso porque a gente está falando de Gideon Gono, ex-presidente do Banco Central do Zimbábue, que venceu o prêmio de Matemática em 2009 depois de realizar uma proeza, Carla. Ele imprimiu nas notas de dinheiro as cifras que vão de um centavo a uma centena de trilhões de dólares.
C: É isso mesmo que vocês ouviram: trilhões de dólares.
D: Eu não consigo nem imaginar esse número.
C: Bizarro!
D: A ideia era “facilitar” a compreensão da população sobre a complicada situação financeira do país. Mas, sinceramente, não deu muito certo, né?
C: Pois é. Ignorando totalmente os conselhos de economistas, Gono imprimiu uma quantidade absurda de dinheiro em 2006, causando a maior hiperinflação do mundo.
D: Para vocês terem uma ideia, a taxa chegou a 231 milhões por cento em julho de 2008. Vocês tem noção de quão absurdo é isso?
C: Eu vejo vários zeros na minha frente. (risos)
D: Bom, pelo menos facilitou a vida para quem queria ser trilionário, né?

SOBE TRILHA OFICIAL DO PROGRAMA

CRÉDITOS

D: E este foi o Choque da Uva, o novo podcast de ciência que explica tudo o que você está a fim de saber de uma maneira diferente.
C: Eu sou Carla Menezes.
D: E eu sou Diego Kerber.
C: O roteiro foi feito por nós e por Marina Cardoso. A produção é de Larissa Gaspar, Luiz Carlos Pavão, Milena Hildete e Samuel Lima. A edição de som ficou por conta do Mateus Figueiredo.
D: Aproveite e siga a gente nas redes sociais: somos o @choquedauvapod, com D mudo, no Twitter, Instagram e Facebook.
C: Até a próxima!
D: Tchau!