Direto ao ponto

02:26 Entrevista com Timothy Verstynen, co-autor do livro ’Do zombies dream of electric sheep?’

11:40 Wesley Luzetti Fotoran: ”Estudos estimam que 50% da população mundial tem o parasita Toxoplasma gondii”

12:57 Minha Vó Tá Certa? Quem tem contato com gatos de rua pode pegar toxoplasmose?

19:41 Manja do Assunto – Jovem Nerd: ”Como a humanidade se comportaria sem o que nos faz agir como animais sociais?”

24:59 Ajuda Aqui! Entenda como são cobradas questões sobre agentes causadores e transmissores nas provas

28:18 Prêmio IgNobel: Seis pessoas que tentaram prever a data exata do fim do mundo

Seu gato pode transformar você em zumbi?

Rodrigo Sampaio: Eu acho que o melhor lugar para você tentar sobreviver em um apocalipse zumbi é um shopping. Você usa todos os suprimentos daquele shopping, depois você vai lá e procura outro shopping. Enquanto isso, vai torcendo para que o Exército consiga eliminar todos os zumbis. Você vai de shopping em shopping. Aí você monta uma barraca, vai tentando sobreviver da melhor maneira que você consegue. 

J: Nossa! Tem bicicleta, tem equipamento de escalada, de natação…

R: Mas nadar em um apocalipse zumbi… A última coisa que eu ia fazer em um apocalipse zumbi é nadar!

(VINHETA: trilha sonora acompanhada da locução “Você está ouvindo Choque da Uva, a ciência no cotidiano”)

(Entra áudio da música “Thriller”, de Michael Jackson)

R: Eles estão por toda parte… 

(Entra áudio da risada maléfica do Vincent Price do clipe “Thriller” do Michael Jackson, seguido de disco arranhando)

R: Mas calma: eles estão no cinema, nos quadrinhos, nas séries, nos games… Os zumbis são figuras icônicas da cultura pop e são um dos temas preferidos dos fãs do universo geek.

J: É aquela história que a gente já está acostumado: os mortos voltam à vida com muita fome de cérebros ou de carne humana. E isso acontece por diversos motivos, seja por um acidente radioativo ou um ataque com armas químicas que transformam o mundo em um verdadeiro cenário de carnificina. 

R: Porém, o enredo mais comum de um apocalipse zumbi ainda é um vírus incurável e desconhecido, que faz com que os mortos voltem à vida. Aí, qualquer respingada de sangue ou mordida pode ser fatal. 

J: Tá, a gente já sabe que ninguém vai virar zumbi na vida real, mas como vírus, bactérias, fungos e parasitas podem afetar os humanos? É isso que vamos descobrir no episódio de hoje. 

R: Eu sou Rodrigo Sampaio. 

J: E eu sou Jéssica Nakamura. 

R: E este é o Choque da Uva, o novo podcast que vai falar sobre ciência de uma maneira diferente./ Nós também estamos nas redes sociais: é só procurar @choquedauvapod no Twitter, Instagram, Facebook e YouTube. 

(Entra áudio da trilha sonora da série “The Walking Dead”)

J: Tá. Antes de tudo, acho que a gente precisa recapitular o que são esses seres da ficção. A história dos zumbis é anterior a Walking Dead e essas coisas. Mas calma que a gente vai chegar lá.

R: Os zumbis que você vê em filmes e em games têm características semelhantes entre si. E foi com base nessas características que os neurocientistas Timothy Verstynen, da Universidade de Pittsburgh, e Bradley Voytek, da Universidade de San Diego, desenvolveram  uma forma bem legal de passar conceitos de biologia e neurociência. Eles fizeram isso no livro Do Zombies Dream of Electric Sheep?, que pode ser traduzido como Os Zumbis Sonham com Ovelhas Elétricas?, ainda sem edição no Brasil, infelizmente. Nessa publicação, a dupla se propôs a imaginar quais partes do cérebro humano teriam de ser afetadas para que surgisse uma criatura como um zumbi. 

J: O Verstynen separou um tempinho na agenda dele para conversar com a gente. 

(Entra áudio Timothy Verstynen falando “Oi, ‘Choque da Uva’. Thanks for listening”)

J: E fica calma, fica calmo, que a gente traduziu tudo. Para começar essa  viagem didática, a dupla definiu um nome chique para o cérebro de um zumbi pós-infecção. Esses seres sofreriam de um Déficit de Hipoatividade de Consciência. Segundo o Verstynen, o nome é uma brincadeira com os acrônimos tão comuns na neuropsicologia.

R: Basicamente, o Timothy explicou para a gente que esse tal vírus ficcional atrofiaria certas partes do cérebro humano. Por exemplo, algumas áreas do córtex orbitofrontal, que são responsáveis por regular as emoções dos humanos. Sem ela, os comportamentos mais instintivos de defesa, centralizados em neurônios chamados amídalas cerebelosas, ficam ao Deus dará. E isso teria como resultado um comportamento de “lutar ou fugir”, mais aflorado nos zumbis.

J: Poxa, é por isso que os zumbis têm comportamento impulsivo nos filmes? E o que poderia explicar as dificuldades de linguagem? 

R: Segundo os pesquisadores, essa desordem provocada pelo vírus seria capaz de desregular as áreas de Broca e de Wernicke.

J: Rapidão, acho que aqui dá para chamar o nosso Momento Faraday.

(VINHETA: trilha sonora acompanhada da locução “Momento Faraday”)

R: Ok, vamos explicar. As áreas de Broca e de Wernicke são responsáveis nos cérebros humanos pela interpretação e pela organização da linguagem, assim como pela capacidade de reter memória e reconhecer pessoas. 

J: Claro que os professores não acreditam que humanos possam virar zumbis um dia. É um daqueles exercícios didáticos, como um professor meu de cursinho fazia. A dupla explica que vírus, bactérias e fungos teriam de passar por uma mutação muito radical para contaminarem humanos e causarem esse nível de destruição. 

R: E Verstynen ainda lembra que, para Hollywood, o que vale é o lado   sanguinolento da coisa – e não o rigor científico, claro. E é isso que a gente vai ver agora.

(Encerra trilha da série “The Walking Dead” e entra áudio da música “Who Wants to Live Forever”, da banda Queen)

J: Se você está ouvindo este episódio, provavelmente você deve curtir filmes de zumbis, mas sabe como eles surgiram na ficção para causar pânico e pesadelo?

R: Eles apareceram pela primeira vez em Hollywood de forma discreta em um filme de terror independente, que se passava no Haiti, chamado White Zombie, de 1934. E o Haiti não tava ali à toa. O filme se inspirou em uns estudos do jornalista americano William Seabrook, que cinco anos antes tinha lançado um livro sobre a religião vodu no país caribenho.

(Encerra trilha de “Who Wants to Live Forever” e inicia trecho de “Imortal”, da dupla Sandy & Júnior).

J: Na literatura ocidental, o primeiro zumbi real oficial apareceu no romance Eu sou a Lenda, de Richard Matheson, lançado em 1954. Se parece familiar, foi porque o livro foi adaptado para o cinema algumas vezes, incluindo a versão de 2007, estrelada pelo Will Smith.

(Entra áudio de trecho do trailer do filme “Eu Sou a Lenda”)

J: O universo zumbi também inspirou quadrinhos como o The Walking Dead, que virou a série mais tarde e teve aquele sucesso todo.

R: E apesar de ser uma coisa mórbida – porque, convenhamos, estamos falando de mortos-vivos à procura de sangue, de cérebros –, ainda assim, muita gente é obcecada por zumbis. 

(Encerra áudio de “Eu Sou a Lenda” e entra trilha do jogo de videogame “The Last of Us”). 

R: Continuando com os sustos e terrores, uma das referências modernas mais famosas e assustadoras é um jogo de videogame lançado em 2013, o The Last of Us.

J: Ele ganhou dezenas de prêmios, como o de melhor jogo, melhor roteiro e tudo mais.

(Entra áudio do trailer de “The Last of Us”). 

J: E os zumbis são apenas um detalhe da história. A trama funciona muito mais como um drama sobre como a humanidade se comporta quando levada à barbárie do que como um terror para assustar você em todos os momentos.

R: Mas sabe qual é a parte mais assustadora? É que os zumbis desse jogo são causados por um fungo que existe na vida real! Vamos lá, Jéssica, conta para o pessoal que fungo é esse!

J: É para já, Rodrigo. Estamos falando do fungo Ophiocordyceps, que na vida real infecta vários tipos de artrópodes, como borboletas, besouros, aranhas e formigas. É tão bizarro que o jogo imagina como seria se esse fungo sofresse algum tipo de mutação e passasse a infectar também os seres humanos. Sinistro.

R: Tá, mas antes de falar desse fungo específico, vamos relembrar o que é um parasita. Parasitas são organismos biológicos que habitam o corpo de um hospedeiro para benefício próprio. Na ficção, por exemplo, os vírus que transformam os seres humanos em zumbis podem ser considerados parasitas, já que tomam o controle do corpo humano para conseguirem os nutrientes que precisam e, assim, infectar outras pessoas.

J: Voltando ao caso do Ophiocordyceps, a ação mais conhecida desse parasita são as formigas-zumbi, que podem ser encontradas na Amazônia brasileira. Esse fungo, quando invade o hospedeiro, libera sinais químicos que fazem com que a formiga mude totalmente de comportamento. O bicho perde o contato com sua colônia e passa a buscar lugares onde o fungo tenha vantagens reprodutivas.

R: Elas costumam parar em troncos de árvores, a alguns centímetros do chão e em locais com bastante luminosidade. Toda essa saga involuntária gera um desgaste enorme para o inseto, que deixa de se alimentar e acaba morrendo. O fungo, por sua vez, cria esporos no corpo do inseto, que liberam toxinas e infectam outras formigas pela ação do vento.

J: Mas será que esse fungo, em alguma hipótese, poderia infectar os seres humanos? O Fernando Andriolli, cientista do Instituto Nacional de Pesquisas, o INPA, que pesquisou essa espécie, explicou para a gente. 

Fernando Andriolli: Esses fungos parasitas, os Ophiocordyceps, são específicos em relação a seus hospedeiros. Então, cada espécie de fungo infecta uma espécie de formiga. Essa relação evoluiu para que eles tenham esse tipo de especificidade. Logo, não seria possível infectar um animal maior ou um vertebrado. Muito menos um ser-humano. Pelo menos não a mesma espécie de fungo que infecta uma formiga, por exemplo. 

(Encerra áudio da trilha de “The Last of Us” e entra áudio de nova trilha do jogo). 

R: E o que não falta na natureza é parasita procurando hospedeiro. Além do Ophiocordyceps, outro bastante peculiar é o Sacculina Carcini, um tipo de craca que quando infecta caranguejos, machos ou fêmeas, forma uma bolsa depositora de ovos e consegue controlar o caranguejo por sinais químicos. 

J: A partir daí, o animal começa a cuidar da bolsa como fosse sua “mãe”. O macho chega a mudar de características morfológicas para se adaptar e cuidar dessa prole surpresa. 

R: Para entendermos um pouco mais sobre esses parasitas, conversamos com Wesley Luzetti Fotoran. Ele é pós-doutorando do Departamento de Parasitologia da USP, que fica no Instituto de Ciências Biomédicas. Wesley, existe algum tipo de parasita que pode transformar os seres humanos em zumbis? 

Wesley Luzetti Fotoran: Para transpor para a espécie humana ao ponto de você tirar a cognição ou a capacidade cognitiva é muito mais complicado. Por causa do córtex pré-frontal, a gente tem uma capacidade cognitiva que é, na verdade, a tomada de decisões. Então, elas não estão simplesmente restritas ao ambiente natural. O que isso quer dizer? Por exemplo, existem medos que são biológicos, existem medos que são socialmente construídos. Isso por causa da nossa capacidade cognitiva. Justamente por isso é mais difícil a gente sofrer algum tipo de controle dos parasitas. Mas alguns parasitas são muito bons. Existem estudos que apontam que somos manipulados por vários deles. 

J: Mas, Wesley, mesmo daqui a milhões de anos, é possível que um parasita evolua ao ponto de transformar um ser humano em algum tipo de zumbi?

Wesley: Provavelmente não. Porque, no fim das contas, você precisa sempre de uma relação de um parasita com um hospedeiro. O ciclo de vida do parasita só se completa se ele tiver o hospedeiro. Em uma situação de extinção da espécie humana, em um apocalipse zumbi, o parasita perderia esse hospedeiro e não teria como completar seu ciclo de vida.  

R: Faz muito sentido pensando por esse lado. Mas e com relação a doenças? Existe algum parasita hoje que seja capaz de mexer com a inteligência do ser humano?

Wesley: Existe. É um parasita clássico, inclusive, o Toxoplasma Gondii. O Toxoplasma Gondii é um parasita como qual a gente geralmente tem contato através do gato. Estudos estimam que 50% da população mundial tenha esse parasita. Os casos não são graves. Geralmente, são assintomáticos – e é isso que preocupa, porque facilita a dispersão do parasita. Quando come o rato, o gato acaba se infectando. As fezes dele acabam liberando ovos que também podem infectar um ser humano, que é o caso clássico da doença. Existem dados que mostram que vários casos de esquizofrenia podem ser causados por esse parasita, por exemplo. Atitudes de risco também podem estar associadas a esse tipo de infecção. Muitos dos acidentes de moto, por exemplo, você consegue correlacionar com casos de pessoas que têm toxoplasma. 

(Encerra nova trilha de “The Last of Us”)

(VINHETA: trilha sonora acompanhada da locução “Minha Vó Tá Certa?”)

(Entra áudio da trilha do “Minha Vó Tá Certa?”)

J: Agora, chegou o momento do programa em que a gente desmente (ou não) aquelas ideias malucas que as nossas avós falavam quando a gente era criança. Tá na hora do quadro Minha Vó Tá Certa?

R: Wesley, aproveitando que a gente está falando sobre felinos e toxoplasmose, minha vó sempre dizia para a gente não brincar com os gatos de rua porque a gente ia ficar doente. Afinal, se eu brincar com um gatinho sem casa, eu vou pegar toxoplasmose?

Wesley: Assim, a toxoplasma tem esse sucesso justamente porque não causa isso a todo mundo. Dependendo de sua construção neuronal, que vem do seu contexto social e das coisas que cercam a sociedade, você pode ser mais ou menos suscetível a uma classe de parasita. O sucesso de conseguir infectar 50% da população é justamente porque ele não provoca a doença em todo mundo.  

J: Muito obrigada, Wesley! Valeu pela participação aqui no Choque da Uva

(Encerra áudio da trilha do “Minha Vó Tá Certa?” e inicia trilha do jogo de videogame “Resident Evil”). 

J: A gente já viu nesse episódio que a chance de um dia virarmos zumbis é zero, mas também é fato que a humanidade já sofreu e ainda sofre com as epidemias. Mas antes de falarmos sobre o assunto, que tal a gente relembrar o que são vírus e bactérias, Rodrigo?

R: Ótimo, Jéssica! Vale destacar que ambos são parasitas, pois usam o corpo humano como hospedeiro. Porém, eles são bem diferentes. O vírus, por exemplo, não tem células. Ele é uma estrutura de DNA ou RNA que entra dentro da célula humana e se apropria dela para se reproduzir. 

J: Por sua vez, a bactéria é uma célula que pode se reproduzir e replicar de maneira própria, seja dentro ou fora do corpo humano.

R: E esses microsseres vivos são perigosos justamente porque o contágio pode acontecer de diferentes formas, seja pela comida, água, ar, relações sexuais… E é justamente aí que surgem as epidemias e as pandemias. 

J: As epidemias são caracterizadas por surtos que acontecem em diferentes locais de uma determinada região, como um Estado ou um país. Já uma pandemia é o pior dos casos. É quando a epidemia atinge diferentes lugares do planeta. 

R: Entre as pandemias mais famosas da história está a Peste Bubônica, mais conhecida como peste negra. A doença, causada pela bactéria Yersinia pestis, virou epidemia na China em 1333, chegando à Europa catorze anos depois. Estima-se que cerca de 25 milhões de pessoas tenham morrido no Velho Continente entre 1347 e 1351 por causa da doença. 

J: Porém, a mais letal da história foi a Gripe Espanhola, uma pandemia do vírus Influenza A que se espalhou pelo mundo em 1918 e, em pouco mais de dois anos, matou 50 milhões de pessoas. 

R: Mas como será que surge uma epidemia? Quem explicou para a gente foi o Hélio Bacha, Consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia. 

Hélio Bacha: As epidemias são eventos inusitados numa comunidade. Então, nós não tínhamos, por exemplo, a zika, que é uma doença causada por um vírus. Ela é trazida por uma população que não tem imunidade nenhuma e acontece, então, uma possibilidade de uma infecção  de um número inusitado de pessoas naquela comunidade. Isso nós chamamos de epidemia. Qualquer qualquer doença que chega naquela comunidade de uma maneira inusitada nós chamamos de epidemia.

(Entra áudio de trilha de)

J: Entrando um pouco na brincadeira, você já imaginou quanto tempo sobreviveria em um apocalipse zumbi, Rodrigo?

R: Com certeza, não por muito tempo. 

J: Bom, um grupo de pesquisadores do departamento de Física da Universidade Federal de Juiz de Fora, a UFJF, decidiu usar a história dos zumbis para criar um modelo de simulação computacional que ajudasse a resolver situações práticas e reais, do dia a dia. Como a luta da polícia contra uma facção criminosa, por exemplo. 

R: Calma lá que a gente explica para você que está ouvindo. Os pesquisadores criaram quatro cenários hipotéticos de apocalipse que levam em conta a interação de três elementos: militares, civis e os próprios zumbis.

J: O físico João Paulo Almeida de Mendonça, um dos responsáveis pelo estudo, falou um pouco mais sobre a pesquisa com a gente. 

João Paulo Almeida de Mendonça: O que os resultados apontaram? Eles apontaram para uma coisa que, em física, a gente chama de transição de fase. Se você pega uma variável desse modelo que, no nosso caso, é quantos militares por mil habitantes você tem no começo do apocalipse zumbi. Se esse número está abaixo de um certo valor, a humanidade é extinta. Se esse número está acima de um certo valor, a humanidade é salva.

J: Em um modelo em que as Forças Armadas são mais fortes, seria necessária uma proporção de pelo menos 47 militares para 1.000 pessoas. Sabe qual é o único país do mundo que sobreviveria, Rodrigo?

R: Sei sim. É a Coreia do Norte!

J: Mas como que você sabe?

R: Está aqui no roteiro! 

J: Pois é. A Coreia do Norte, que tem 47,7 soldados para cada 1.000 habitantes. Nós aqui do Brasil seríamos aniquilados. Por aqui, a proporção é de 1,6 por 1.000 pessoas. 

R: Nem os Estados Unidos, maior potência militar do planeta e epicentro de todos as epidemias zumbis no cinema, estariam a salvos. O país tem uma proporção de 4,2 militares para 1.000 americanos. Imagina só?

J: Claro que tudo isso não passa de um modelo de simulação em computador. Mas, segundo João Paulo, a ideia do estudo é traçar paralelos com problemas da vida real.

João Paulo: O título do trabalho, como foi publicado, é “Modelar um apocalipse zumbi hipotético pode nos salvar de monstros do mundo real”. Isso porque a modelagem matemática que foi usada aqui, baseada em filmes e em probabilidades que a gente vê em séries de televisão e jogos, tem paralelo muito forte com coisas da vida real, como epidemias de doenças, mas também com combate à violência e ao crime organizado, além de várias outras situações do mundo biológico. Tudo que a gente está vendo aqui serve perfeitamente para modelar o caso, por exemplo, de uma polícia que está tentando lutar contra uma organização criminosa. A polícia pode arrebanhar membros da comunidade para ajudá-la, assim como a organização criminosa pode arrebanhar membros da comunidade para ajudá-la a lutar. Então, o modelo matemático é robusto e serve para tratar uma outra gama de problemas, com uma aplicação muito forte no nosso dia a dia. 

(Encerra trilha do jogo “Resident Evil”). 

(VINHETA: trilha sonora acompanhada da locução “Manja do Assunto”). 

(Entra áudio da música “O Terror Tem Nome”, de MC Kauan). 

J: A gente já viu de tudo sobre zumbi, desde o surgimento na literatura até na biologia e na matemática. E nada mais justo do que tratar de cultura pop com alguém que basicamente capinou o terreno das referências nerds na internet.

R: O nosso repórter e editor de som Felipe Goldenberg conversou com Alexandre Ottoni, o Jovem Nerd, e Deive Pazos, o Azaghal, meus conterrâneos do Jovem Nerd. Eles são um dos canais mais tradicionais do YouTube, que conta com mais de 2 milhões de inscritos, além das vozes por trás do Nerdcast, o podcast mais ouvido do Brasil segundo o Spotify. 

(Encerra música “O Terror Tem Nome” e inicia áudio do toque de chamadas do Hangouts seguido pela trilha do filme “Guerra Mundial Z”).

Felipe Goldenberg: Oi, pessoal, tudo bem? Eu tô aqui com o Alexandre Ottoni e o Deive Pazos. Eles fazem parte do Jovem Nerd, que é um canal no YouTube, um site um podcast e um monte de coisa sobre cultura pop e cultura nerd. Eles estão aqui para falar com a gente para o Choque da Uva. E aí, pessoal, tudo bem com vocês?

Jovem Nerd: Tudo ótimo.

F: Tudo ótimo. Gente, eu sei que vocês tão ligados em tudo que é cultura pop e tudo que tá acontecendo no mundo nerd. Por que existe tanto fascínio por zumbis entre os fãs de coisas geeks? Como surgiu? Por que o pessoal gosta tanto?

Azaghal: Na cultura pop, o zumbi é o inimigo que você pode matar sem culpa, né?

Jovem Nerd: A gente chegou a essa conclusão. É a violência justificada. É uma válvula de escape para justificar a violência, basicamente isso. Não existe outra forma de se combater zumbis.

Azaghal: Robô você também pode matar sem culpa.

Jovem Nerd: Isso com certeza vai acontecer.

Azaghal: Só que eles que vão matar sem culpa. (risos)

F: Qual história de zumbi marcou vocês? 

Azaghal: Eu gosto bastante… tenho um apego emotivo com A Volta dos Mortos Vivos

Jovem Nerd: Ah, dos anos 1980.

Azaghal: Bem clássico! São uns caras que trabalham em um depósito que tem corpos embalsamados para estudo e exposição. Eles têm um barril com um corpo lá dentro, um barril militar. O cara fala assim: “Esse aqui é militar. Isso aqui não vaza não”. Daí, boom! Vaza, tudo vira zumbi. Eu gosto tanto desse filme que aqui no nosso escritório a gente fez uma réplica desse tambor com o zumbi dentro. Fica na sala de reunião, é a base da mesa.  

F: Nada intimidador.

Azaghal: (risos) É pra gente estar sempre ligado. É a war room, tem de estar preparado para tudo.

Jovem Nerd: O que me marcou de verdade foi o jogo The Last of Us

F: Ah, muito bom. 

Jovem Nerd: Foi o primeiro jogo com que eu realmente me conectei emocionalmente com os personagens. Jogo para mim era tudo boneco, sabe? E o The Last of Us foi um primor de animação, jogabilidade e, principalmente, de roteiro. A história de zumbis nunca é sobre os zumbis, é sobre as pessoas, é sobre os seres humanos que sobreviveram e as suas relações.

Azaghal: E como as pessoas se comportam no limite.

Jovem Nerd: Se existe razão para continuar vivendo no mundo assim, como a humanidade se comporta se a gente tirar tudo o que nos faz agir como animais sociais? Até onde a gente permanece civilizado? Esse é um exercício legal. A gente mesmo já lançou vários produtos relacionados como o clássico livro Protocolo Bluehand Zumbis, que é o nosso Manual de Sobrevivência ao apocalipse zumbi, um livro completamente ilustrado. Se você olhar a versão impressa, ela tem não só o texto escrito, mas anotações, grifagens, esquemas ilustrados de sobrevivência… Outra obra que a gente lançou foi o graphic novel Independência ou Mortos, que a ideia é de D. Pedro I lutando contra zumbis no Brasil colonial. A rainha louca era o primeiro zumbi.

F: Estou tentando imaginar agora como seria um apocalipse zumbi no Brasil. Conseguiríamos receber um evento dessa grandeza? 

Jovem Nerd: (risos) Sim, isso isso está inclusive nas páginas do protocolo zumbi. Tem essa piada.

(Encerra trilha do filme “Guerra Mundial Z”).  

J: Vestibulandos de plantão, cheguem mais porque este momento é feito pra vocês.

(VINHETA: trilha sonora acompanhada da locução “Ajuda Aqui”). 

(Inicia trilha do filme “Eu Sou a Lenda”). 

R: Isso mesmo. Chegou a hora do quadro Ajuda Aqui, em que mostramos como o tema do nosso episódio pode ser abordado em provas. 

J: Quem vai nos ajudar dessa vez é a coordenadora de Biologia do Grupo Etapa, a professora Roseli Dias. E, aí, professora, o que exatamente os alunos devem estudar?

Roseli Dias: Primeiramente, é importante que os candidatos saibam diferenciar epidemia, endemia e pandemia. Atenção, porque temos aqui três conceitos diferentes. Tratando-se de doenças, os vestibulares gostam de perguntar sobre o agente causador ou etiológico, o agente transmissor ou vetor hospedeiro intermediário e definitivo, as formas de transmissão e as formas de prevenção ou profilaxia, e também podem associar as doenças com as relações do sistema imunitário.

O primeiro exemplo é a dengue, uma virose clássica, conhecida por todos. Clássica nos vestibulares. E esta virose é transmitida pela picada da fêmea contaminada do mosquito Aedes Aegypti. Lembrando que, neste caso, temos quatro sorotipos diferentes do vírus que causam quatro tipos de dengue. Também não vamos esquecer que os mosquitos Aedes Aegypti podem transmitir outras viroses, como chikungunya e febre amarela urbana.

Outras doenças causadas por vírus que foram destaques neste ano são o sarampo, a poliomielite e a caxumba, que voltaram a infectar crianças e adultos. Isso tudo porque nos últimos anos tivemos uma baixa cobertura vacinal. Como essas três viroses são prevenidas com a vacinação, candidatos, fiquem bem atentos, porque vocês podem encontrar questões fazendo a associação dessas doenças com as vacinas. 

Outro exemplo em destaque que acionou o alarme vermelho do sistema de saúde devido ao grande aumento de casos é a sífilis. Mais uma doença com aumento de casos de casos especialmente nos centros urbanos – atenção, especialmente nos centros urbanos – é a leishmaniose visceral, causada pelo protozoário Leishmania chagasi e transmitida pela picada da fêmea contaminada do mosquito do gênero Lutzomyia, também conhecido como mosquito-palha. Atenção: mosquito-palha, este nome aparece pelos vestibulares. 

Por fim, tivemos um surto de doença de Chagas, em que pessoas podem ter sido contaminadas principalmente pela ingestão de alimentos. O açaí, por exemplo. Os alimentos continham partes do barbeiro, que é o transmissor, e as suas fezes contaminadas com o protozoário Trypanossoma cruzi, que é o causador da doença de Chagas. Bem, trouxemos aqui algumas viroses, uma bacteriose e protozooses. Fiquem atentos a essas doenças, a novidades e a outras doenças que ocorrem no nosso País. E como cantam os Titãs, depois de tantas doenças, “o pulso ainda pulsa”. Até a próxima.

(Encerra trilha do filme “Eu Sou a Lenda” e entra áudio da música “O Pulso”, da banda Titãs). 

R: Estamos chegando ao fim do nosso programa, e como vocês já sabem, no fim de cada episódio nós temos o nosso Prêmio IgNobel. 

(VINHETA: trilha sonora acompanhada da locução “Prêmio IgNobel”). 

J: E o Prêmio IgNobel de hoje não vai para uma, nem duas, nem três, mas seis pessoas! É isso mesmo, pessoal. Hoje a gente falou de apocalipse, fim da humanidade, nada mais justo do que dedicarmos este momento para o tema, né, Rodrigo? 

R: É isso aí, Jéssica. O IgNobel de hoje foi concedido em 2011, na categoria de Matemática, e é uma homenagem a todos aqueles que tentaram prever a data exata do fim do mundo mas falharam de forma horrível. Isso é o que dá confiar demais nas suas habilidades numéricas.

J: Na hora de fechar a conta no bar ou no restaurante, eu pego logo a calculadora para não cometer esse tipo de erro. 

R: E acabar com o mundo!

J: Vamos lá. A primeira contemplada é Dorothy Martin, uma dona de casa moradora de Chicago, nos Estados Unidos, que em 1954 jurou ter recebido mensagens de alienígenas dizendo que o mundo ia passar por maus bocados no ano seguinte. E tava errada. 

R: Depois, veio o pastor Pat Robertson, também americano e que, inclusive, quase concorreu à presidência dos Estados Unidos. Ele acreditava que o mundo acabaria em 1982, falou isso em rede nacional e tudo. O que, bem, também não aconteceu.

J: A terceira contemplada é a americana Elizabeth Clare Prophet. Mística, professora espiritual e mensageira dos mestres ascensionados (seja lá o que seja isso), ela acreditava que o planeta Terra não passaria de 1990. Mas passou.

R: Não muito tempo depois da Elizabeth apareceu o profeta sul-coreano Lee Jang Rim, que disse que o mundo acabaria em 1992. Não satisfeito, ele convenceu muita gente a se demitir e doar todos os seus pertences à igreja, com a promessa de que suas almas seriam automaticamente levadas ao Paraíso. Acho que isso não aconteceu.

J: Também teve a Credonia Mwerinde, da Uganda, que jurava de pés juntos que o apocalipse aconteceria em 1999, antes do famigerado bug do milênio. 

R: E, por último, mas não menos importante, está o engenheiro americano Harold Camping, ex-proprietário de uma rede de rádios protestantes nos EUA. Vejam só: ele conseguiu a façanha de errar não só uma, mas três vezes. Primeiro, ele disse que a vida no planeta acabaria em 6 de setembro de 1994. Quando chegou a data e nada aconteceu, Harold admitiu ter errado nos cálculos e disse que, na verdade, o mundo veria seu fim em 21 de maio de 2011, quase 20 anos depois. 

J: Pois é. E quando fatídico dia chegou, mais uma vez, a vida continuou como era antes. Daí ele disse que errou as contas por causa de problemas pessoais, pediu paciência aos fiéis e cravou que o apocalipse viria, na verdade, no dia 21 de outubro daquele mesmo ano, em 2011 ainda. Mas adivinha o que aconteceu na data marcada?

R: Como já era de se esperar, nada. Foi só então que o radialista decidiu aceitar a derrota e se desculpar publicamente pelos palpites, nas suas próprias palavras, “incorretos e pecaminosos”, dizendo que ele não era um gênio e que rezava o tempo todo por sabedoria. Depois de todas essas bolas foras, só restou a Harold se aposentar e deixar o cargo na rádio que liderava. 

J: Se eu não soubesse que esse Harold é americano eu chutaria que ele é brasileiro, porque, olha, taí um cara que não desiste nunca! 

(Entra áudio da trilha oficial do Choque da Uva). 

R: E este foi o Choque da Uva, o novo podcast de ciência que explica tudo o que você está a fim de saber. 

J: Eu sou Jéssica Nakamura. 

R: E eu sou Rodrigo Sampaio. O roteiro desse episódio foi meu e da Brenda Zacharias. 

J: A produção contou comigo, com André Marinho, Brenda Zacharias, Felipe Goldenberg e Luiz Carlos Pavão.

R: A edição de som também ficou por conta do Felipe Goldenberg.

J: A gente também faz um agradecimento especial ao pessoal do Jovem Nerd, que participou hoje do nosso programa. 

R: Então já sabem, pessoal. Ouçam o Nerdcast e sigam o canal deles no YouTube. É só procurar lá “Jovem Nerd” que vocês acham!

J: Aproveita e segue a gente também no Twitter, Facebook, Instagram e também no YouTube: somos o @choquedauvapod. 

R: Lembrando que este programa é um projeto da 30ª turma do Curso Estado de Jornalismo, os Focas aqui do Estadão. 

J: Até mais. 

R: Tchau, tchau.