O primeiro contato deixou uma boa impressão: “Ele é fofo, bonitinho e amigo”, disse Cecília Soares, de 7 anos, logo após conhecer o Robios. Criado pela startup brasileira NTU, o robô cuidador começou recentemente a interagir com crianças como Cecília, que têm Doença Renal Crônica (DRC). O teste inicial ocorreu em 4 de julho, no Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da USP. E o Estadão QR estava lá.
O robô é capaz de se locomover e tem uma interface interativa. Robios conversa com a criança tanto para dar orientações quanto para coletar dados.
“É diferente de um celular ou um tablet, em que é a criança que controla o dispositivo”, explica Flavio Yamamoto, CEO da startup NTU. “Nesse caso, o robô é independente, incorpora uma personalidade.”
Yamamoto conta que um dos desafios para o desenvolvimento dessa relação entre humanos e robôs autônomos é cultural. “Precisa de uma convergência social. A aceitação depende da cultura das pessoas e de elas estarem dispostas a adotar essa ferramenta como parte do processo de comunicação.” É o que estuda o ramo da robótica social.
Segundo a médica Andrea Watanabe, especialista em pediatria que acompanha o projeto no Hospital das Clínicas, o primeiro contato do Robios com as crianças foi positivo. Durante a manhã da estreia, o robô conseguiu dar orientações sobre saúde bucal. Na próxima visita, ele vai conversar com as crianças e registrar as informações.
“Se a gente avaliar que de fato o projeto teve impacto, ele pode ser replicado para outros lugares que tenham o mesmo tipo de paciente. Com isso, a gente vai estar, através dos robôs, multiplicando esse conhecimento.”
Andrea Watanabe, médica especialista em pediatria
Quer saber mais sobre o primeiro teste do robô Robios no ICr-HC? Veja a reportagem no Youtube do Estadão QR:
Embora no Brasil o uso de robôs cuidadores esteja mais avançado em projetos com crianças, no mundo a robótica social se voltou inicialmente para pessoas da terceira idade. No Japão, onde 26,3% da população é idosa, segundo dados de 2017 da Organização Mundial da Saúde (OMS), os robôs sociais já exercem essa função.
O mesmo deve ocorrer por aqui, em decorrência do rápido processo de envelhecimento populacional do País. Atualmente, 13% dos brasileiros são idosos. Mas a previsão é que esse porcentual aumente para 34% em 2060, de acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU). No Japão, a proporção chegará a 42%.
Conheça os principais robôs cuidadores no mundo:
Foto: Yves Herman/Reuters
Foto: Steve Marcus/Reuters
Foto: Aly Song/Reuters
Foto: Dmitry Kostyukov/Reuters
Foto: Kim Kyung/Reuters
E os estudos para o uso de robôs cuidadores de idosos no Brasil já começaram. O Laboratório de Aprendizado de Robôs (LAR) da USP, em São Carlos, importou neste ano o robô Pepper, que veio justamente do Japão e deve ser testado nos próximos meses.
Quem lidera esse projeto no LAR é a professora Roseli Romero. Ela afirma que a ideia é que o robô realize tarefas como entregar um copo de água e lembrar o idoso do horário de um remédio.
“Um dos pontos de pesquisa em aberto é como tornar o robô mais persuasivo. No caso, por exemplo, de o idoso não querer tomar um remédio na hora determinada. O robô, além de conhecer os gostos do idoso, precisa apresentar uma expressão agradável e uma comunicação verbal convincente”
Roseli Romero, coordenadora do Laboratório de Aprendizados de Robôs (LAR) da USP
Um dos primeiros projetos de robótica social no Brasil foi desenvolvido ainda em 2011 pelo então estudante de ciência da computação Gustavo Pantuza, em Minas Gerais. Ele criou o Pitoco, para cuidar de idosos com Alzheimer. O projeto, na época, não foi para frente porque Gustavo optou por seguir a carreira acadêmica.
Ele conta que um dos principais desafios era melhorar a aparência do robô. “Para entregar um produto com adesão no mercado, era importante desenvolver melhor a interface homem-máquina, para que a interação com o robô fosse mais natural”, afirma.
Quer saber mais sobre o futuro dos robôs cuidadores no Brasil? Ouça um episódio da série de podcasts “Robôs: eles já estão entre nós” do Estadão QR.
Todos esses desafios para que a interação do robô cuidador com crianças e idosos seja bem-sucedida levantam questionamentos sobre como será esse tipo de relação no futuro. Para o futurologista britânico Ian Pearson, as pessoas serão capazes de formar um vínculo emocional com os robôs, assim como acontece com ursos de pelúcia, por exemplo. Mas Pearson não acredita que vamos aderir totalmente a essa tecnologia.
“As pessoas se sentem muito culpadas se maltratarem um robô, por exemplo, e sentem pena dele da mesma forma que sentiriam de um ser humano. Então, nós permitiremos que eles cuidem de nós. Mas vamos, provavelmente, preferir outro humano, porque temos uma afinidade natural. Pessoas ainda vão preferir seres humanos a robôs.”
Ian Pearson, futurologista da consultoria Futurizon