Com um lineup completamente feminino para comemorar o Dia Internacional da Mulher, o Memorial da América Latina recebe nos dias 7 e 8 de março a primeira edição do Festival GRLS!. “Estamos dando voz para que as mulheres tenham a mesma oportunidade e consigam receber o mesmo que os homens”, explica Paola Wescher, diretora artística da Time For Fun (T4F) e sócia do jornalista Lúcio Ribeiro na marca Popload, realizadoras do evento.
Além de shows da diva pop australiana Kylie Minogue, do grupo britânico Little Mix e da revelação do rap Tierra Whack, o evento traz apresentações de Linn da Quebrada, Gaby Amarantos, Iza e as meninas da Mulamba. Antes das atrações musicais, há rodas de palestras lideradas por nomes como Conceição Evaristo, Jout Jout, Djamila Ribeiro e Astrid Fontenelle.
“Um festival focado para o Dia Internacional da Mulher não poderia ser só de música”, conta a produtora, que há anos queria realizar um evento dedicado às mulheres. “Vimos que precisaríamos discutir vários assuntos.”
Nesta entrevista ao site Capitu, Paola Wescher fala, ainda, sobre o desafio de produzir festivais no Brasil e o tratamento recebido pelas mulheres na indústria do entretenimento. Confira, abaixo, os principais trechos:
Como surgiu a ideia de um festival com lineup inteiramente feminino?
A gente já queria ter feito o festival, mas estávamos há uns quatro anos na esperança de o Dia da Mulher cair no fim de semana. Este ano, calhou de cair. Quando falei dentro da T4F que queria fazer o evento nessa data, o pessoal disse ‘Tudo bem então, vamos transformar em um festival’. Era algo bem menor e mais simples, e então começamos a desenhar esse formato final.
E como chegaram a esse formato?
Um festival com foco no Dia Internacional da Mulher não poderia ser só de música. Queríamos que tivesse outra proporção e fosse transformador. Para isso, vimos que precisaríamos discutir vários assuntos e questões mais profundas, tentando falar com o maior número possível de pessoas sobre igualdade de gênero. Primeiro, pensamos no formato, com palestras, oficinas e um espaço para as pessoas mostrarem seu trabalho. Depois, veio a curadoria em si. Em termos de música, queríamos que o evento tivesse um número proporcional de bandas nacionais e internacionais, considerando também questões como raça e gênero.
A maioria dos grandes festivais brasileiros, como Lollapalooza e Rock In Rio, é criticada por ter poucas mulheres como headliners. Foi difícil conseguir um lineup exclusivo de mulheres, em termos de público ou demanda?
No Popload, sempre tivemos mulheres como protagonistas. Eu sou mulher e, para mim, é muito natural ter artistas mulheres em um lineup. Não acho nada difícil incluir mulheres, acho ótimo. Essa ainda é uma questão na indústria musical, mas as premiações deste ano mostram que o mercado está mudando nos últimos anos. Até porque o público de hoje é mais fluído. Ou seja, as mudanças são um reflexo natural do nosso próprio comportamento, da chegada das novas gerações. Como mulher, acho importante valorizar e mostrar que somos boas em tudo. Só estamos ajudando a dar voz para que as mulheres tenham a mesma oportunidade, para que elas passem a receber o mesmo que um homem headliner. Fizemos várias pesquisas para provar que a quantidade de público masculino e feminino seria equilibrada no evento.
Qual foi o principal objetivo por trás da curadoria de palestras?
O “GRLS Talks” foi pensado por Renata Simões e Ísis Vergílio. Conversei com elas para que ajudassem a gente, porque era algo que nunca tínhamos feito antes. Discutimos muito sobre quais temas abordar e como poderíamos estruturar, apesar do prazo bem curto que tínhamos para a produção. Quando pensamos no festival como um todo, imaginamos a experiência de a pessoa chegar cedo e passar pelo ciclo de palestras e oficinas. Uma pessoa que não está ligada de forma cotidiana às questões femininas vai adquirir tanto conhecimento durante o evento que será quase impossível, na minha opinião, ela continuar pensando como antes. A transformação é importante para esse festival. Na hora dos shows, queríamos que as atrações fossem algo mais dançante, para extravasar com leveza. Você passa o dia refletindo e, na hora da música, se joga mesmo.
A cotação do dólar tem batido recordes históricos no Brasil em 2020. Esse clima dificulta a produção de entretenimento?
A economia para quem vive na América do Sul sempre vai ser desafiadora. Então, sempre vamos competir com um mercado de fora do Brasil. O tanto que podemos pagar é proporcional ao dólar. A questão do patrocínio também é sempre difícil, porque precisamos equacionar estrutura, cachê, preço de ingresso e quantidade de anunciantes. Essa é sempre a parte mais difícil de todas. O que eu sinto hoje é que, quando você tem um festival novo, é muito mais difícil tornar o evento viável. Porque é o primeiro ano e os artistas não sabem se vai ser algo bom. Quando há uma causa envolvida, os artistas também pensam se é interessante participar. O mesmo ocorre com as marcas. Todo mundo acha a ideia incrível, mas você nunca sabe como vai ser.