As perspectivas econômicas por elas: especialistas apontam quais medidas que devem ser tomadas para garantir um crescimento sólido do Brasil

Olhar para o futuro: o que deve ser feito (e quando) para o País crescer

Reunimos um time de primeira para discutir uma agenda econômica que, na opinião delas, deveria incluir mais do que reforma da Previdência e ajuste fiscal

Consolidar a recuperação econômica do Brasil é o grande desafio do próximo governo. Neste cenário, a reforma da Previdência e o ajuste fiscal são temas centrais. Mas quais devem ser as demais prioridades para o País garantir um crescimento sólido?

Ouvimos cinco economistas e uma jornalista com longa trajetória na cobertura econômica. Elas garantem que ações relacionadas à educação, à eficiência do Estado e à participação feminina devem fazer parte da agenda. Melhorar a produtividade também está em pauta. Assim como o desafio que a nova gestão vai enfrentar para negociar a política econômica.

Marcos de Paula/Estadão – 14/2/2012Monica de Bolle, economista e colunista do Estado
Os pontos centrais da agenda econômica indicada por Monica de Bolle são a educação e a maior participação feminina no mercado de trabalho

 

A maior presença delas no mercado de trabalho

Monica de Bolle. A inclusão de mais mulheres no mercado de trabalho e a redução das desigualdades salariais são pontos centrais da agenda que Monica de Bolle coloca como ideal para o País. Segundo a professora da School for Advanced International Studies da Johns Hopkins University e pesquisadora sênior do Peterson Institute for International Economics, diferentes estudos mostram que a inclusão feminina no mercado de trabalho tende a elevar bastante o crescimento e a produtividade no longo prazo. Mas ela ressalta que, por causa da recessão de 2015 e 2016, há uma tendência clara no Brasil de redução da participação feminina no mercado de trabalho. Nesse sentido, seria necessário promover diferentes políticas, como ações para mulheres que não têm acesso a creches e precisam trabalhar. De acordo com Mônica, que é colunista do Estado, a disparidade de salário no País requer atenção do governo e não pode ser solucionada pelo mercado. Só que o assunto tem sido deixado de lado. Segundo a economista, existe uma vasta documentação internacional e relativa ao Brasil que mostra que a disparidade persiste quando controladas todas as outras características dos trabalhadores que não as de gênero – e essa diferença salarial tende a diminuir a participação das mulheres no mercado de trabalho.

 

Arquivo BNP Paribas Asset ManagementTatiana, a economista-chefe no BNP Paribas Asset Management
Para Tatiana, a economista-chefe no BNP Paribas Asset Management, o crescimento do país está relacionado à produtividade e nesse sentido educação é um ponto-chave

Para um país mais produtivo, o investimento em educação

Juliana Inhasz. A professora doutora de economia Juliana Inhasz, do Insper, aponta que é fundamental pensar em formas de aumentar a produtividade, para que não ocorram gargalos de crescimento no futuro. Ela destaca a importância de repensar a questão educacional e o estímulo à qualificação no Brasil. “É preciso realizar investimentos não só em equipamentos, mas em capital humano, pesquisa e desenvolvimento.”

Tatiana Pinheiro. A educação é um dos temas-chave para a economista-chefe do BNP Paribas Asset Management, Tatiana Pinheiro. “A saída é via produtividade e aí não tem como não falar de educação.” Tatiana explica que o Brasil, nos últimos dez anos, registrou baixa taxa de crescimento de produtividade e que esse descompasso leva a limitações no longo prazo, além de diminuir a competitividade frente a outros países. “O crescimento potencial depende basicamente da força da mão de obra, que passa por qualidade e por capital. E essa qualidade depende de uma melhor formação e educação”, explica Tatiana. Nesse sentido, a economista destaca que é essencial que, em uma agenda de crescimento de médio e longo prazo, haja o redesenho do planejamento de educação no País, priorizando a educação fundamental com gastos maiores e mais eficientes. De acordo com a especialista, o modelo hoje prioriza a educação superior, mas grande parte da população não chega a esse estágio. “De alguma maneira, quando você foca muito na educação superior, está aumentando a inequidade de renda. A educação fundamental acaba promovendo a equidade social.”

Monica de Bolle. A importância da educação também é destacada por Monica. “O grande problema atualmente, é que a pauta de educação se tornou ideológica, com a discussão do Escola Sem Partido”, diz. A especialista alerta que é preciso ter foco no acesso à educação de qualidade para crianças e adolescentes, para não provocar mais atrasos no País.

 

Adaptações necessárias para a 4ª revolução industrial

Celina Ramalho. A professora da FGV comenta que é importante consolidar as instituições para a próxima década. Segundo ela, o foco de longo prazo deve ser uma reforma institucional no País que englobe a 4ª Revolução Industrial, que está relacionada à convergência de tecnologias digitais, físicas e biológicas.

 

De olho no exterior

Cida Damasco. De acordo com a jornalista e colunista do Estado Cida Damasco, todos os olhares estarão dirigidos para o próximo governo, principalmente porque ainda há dúvidas em relação à conciliação de diferentes áreas da gestão. Cida aponta possíveis ruídos entre a área de comércio exterior, muito atrelada à diplomacia, e a equipe econômica liberal, que já faz grandes acenos ao mercado.

Juliana Inhaz. A economista do Insper diz que o potencial de crescimento do Brasil para o exterior é muito grande. “Se o País fizer uma gestão inteligente de recursos e aproveitar o espaço criado pela guerra comercial entre China e Estados Unidos, o mercado consumidor do produto brasileiro em âmbito externo pode crescer”, afirma. A especialista ressalta, porém, que as oportunidades podem esbarrar em problemas de produtividade. Ela cita o exemplo da produção de soja, que não consegue atender grandes demandas adicionais, mesmo que elas existam.

Elena Landau. Na opinião da economista e advogada Elena Landau, colunista do Estado, é necessário promover uma agenda de abertura comercial para integrar o País. “Não haverá aumento de produtividade e eficiência se o Brasil continuar com a economia mais fechada do mundo”, completa.

Celina Ramalho. Para Celina, a política externa deve ser vista com cautela, dentro de uma tendência mundial de protecionismo. Ela comenta que é importante ter atenção à maneira como o Brasil se coloca na economia mundial. “Precisamos nos posicionar como um player importante e um país rico como tal.”

 

Meio Ambiente é uma questão da sociedade

Elena Landau. A colunista do Estado destaca a importância de que o Brasil continue no Acordo de Paris, fazendo esforços, mas melhorando seu posicionamento, defendendo os interesses e o meio ambiente do País.

 

Felipe Rau/Estadão – 1/7/2016Cida Damasco, colunista do Estado
Cida Damasco, colunista do Estado especialista em economia, afirma que a negociação entre o Executivo e o Congresso será fundamental para as medidas econômicas que serão tomadas nos próximos anos

 

As possíveis escolhas da política econômica no próximo governo

Cida Damasco. É preciso observar como a política econômica será feita no próximo governo, afirma Cida Damasco. Segundo a colunista, a equipe econômica que chega ao Planalto tem perfil mais ou menos homogêneo, mas que às vezes não combina com outros grupos abrigados dentro do governo de Jair Bolsonaro (PSL). Nesse sentido, é preciso observar como se dará a conciliação entre essas equipes. Cida também chama atenção para a negociação entre o Executivo e o Congresso, que vai influenciar de forma decisiva os caminhos da economia. “Sabemos que as questões principais, especialmente as reformas, vão passar pelo Congresso. E ele pode analisar, complicar ou ajudar o governo. Então, essa negociação é crucial.” Cida comenta que o grupo próximo a Bolsonaro vem tentando até o momento negociar com as bancadas e não com os partidos, como é tradicional. “Vamos ver como será esse caminho, se ele vai se firmar ou se haverá alguma virada mais para frente.”

Monica de Bolle. A economista destaca que o presidente foi eleito com apoio da bancada evangélica, que está controlando a agenda do novo governo. “Ainda que tenha retrocessos e não seja inclusiva, o fato é que essa é a agenda que tem legitimidade política hoje.” Na opinião dela, a agenda de costumes será predominante, assim como a de discussão econômica. “E, nesse sentido, uma coisa pode atrapalhar a outra”, acrescenta. Na opinião dela, a visão do próximo ministro da Economia, Paulo Guedes, em relação à reforma econômica é muito estreita. “A ideia de um Estado minimalista é ultrapassada no mundo todo”, justifica a economista. “A agenda conservadora do novo governo traz um liberalismo deturpado, que não resultará em crescimento sustentado de longo prazo.”

Celina Ramalho. Para a economista e professora da Fundação Getulio Vargas (FGV), tudo indica que a nova equipe econômica deve assumir uma política expansionista, com estímulo à produtividade, e depois arrecadando impostos em consequência de um mercado mais aquecido de vendas e importações.

 

Não há como escapar, o ajuste fiscal é necessário

Tatiana Pinheiro. “O Estado precisa reequilibrar as contas não só da União, mas de Estados e Municípios, para poder investir em educação, produtividade e outras frentes”, afirma a economista-chefe do BNP Paribas Asset Management.

Juliana Inhasz. A economista comenta que mesmo que não haja um superávit primário nos anos iniciais, se o déficit for reduzido de maneira mais forte, já haverá um espaço para outras medidas. No entanto, na opinião dela, é preciso mesclar ações de curto e longo prazo para que a agenda se solidifique. A professora do Insper destaca ainda a importância de tomar medidas com relação à previdência, por causa de seus efeitos no longo prazo. “É lá que estamos com o problema de insustentabilidade de aposentados e pessoas que vão financiar essa aposentadoria.” A economista comenta que se a reforma não for realizada haverá prejuízos que podem resultar em outro gargalo de crescimento econômico.

Cida Damasco. Segundo Cida, o período de dificuldades pelo qual o País passará tem a ver com o equilíbrio entre o ajuste fiscal e a retomada de crescimento. Para ela, deve haver melhor distribuição dos resultados e diversidade. Nesse sentido, a colunista do Estado destaca que há a expectativa de que as reformas, principalmente a da previdência, tenham um perfil de maior justiça. “As reformas e os ajustes precisam recair sobre o conjunto da população e não só sobre uma parcela dela”, diz.

 

Fabio Motta/Estadão – 24/01/2018Elena Landau, economista, advogada e colunista do Estado
A economista e advogada Elena Landau diz que as privatizações exigem preparação e não podem tirar a prioridade da reforma da previdência

 

As famosas privatizações e outras reformas importantes

Elena Landau. A economista destaca que as privatizações são importantes, mas não serão feitas no curto prazo e não terão efeito na dívida e no ajuste fiscal como se atribui hoje. Segundo Elena, o uso das privatizações para abate da dívida não pode tirar a prioridade da reforma da Previdência. “Se você vender todos os ativos sem fazer a reforma da Previdência, você não impede o crescimento dos gastos. Não adianta”, afirma. Para a economista, as privatizações têm um lado fundamental, de melhoria da eficiência do Estado brasileiro e da qualidade da prestação de serviço, mas muitas não podem ser feitas de imediato, requerem preparação e precisam respeitar a Constituição. Elena destaca, ainda, que outras reformas são necessárias, como a simplificação do sistema tributário, mas devem ser feitas com calma.

 

Com a retomada, espera-se menos desemprego

Juliana Inhasz. Com a solidificação da retomada, a taxa de desemprego deve cair com uma velocidade maior, destaca a professora do Insper. De acordo com últimos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de desocupação entre agosto e outubro foi de 11,7%. No trimestre anterior, entre maio e julho, a taxa foi de 12,3%, representando 12,8 milhões de desempregados.

Cida Damasco. A jornalista acredita que uma atenção especial deve ser direcionada para que a parcela da população que está fora do mercado de trabalho consiga retomar seus empregos. Além disso, a especialista lembra que é preciso haver acesso mais tranquilo para as pessoas que estão chegando ao mercado, os jovens.

Eduardo FrazãoJuliana Inhasz, professora de economia do Insper
Juliana Inhasz, professora de economia do Insper, destaca uma medida importante é aumentar a eficiência do Estado para melhor atender a população

 

Um Estado mais eficiente para melhor atender a sociedade

Juliana Inhasz. O Estado precisa encontrar formas de ser mais eficiente, atendendo melhor a sociedade em termos de fornecimento de renda e serviços e alocando melhor os recursos, diz Juliana. Essa melhora de eficiência, por sua vez, pode levar a mais possibilidades de investimento na economia, retomando o papel de impulsionador de investimentos que o Estado desempenha por meio dos projetos de infraestrutura. Nesse sentido, a economista acredita que é preciso reduzir o tamanho do governo e consequentemente sua participação na economia. Essa redução possibilitaria uma eventual redistribuição de recursos entre pastas pressionadas, como Saúde e Educação, além de uma reavaliação das expectativas de crescimento ao longo do tempo. Se a sociedade enxergar que o Estado está comprometido com uma agenda de crescimento, provavelmente haverá um aumento da produtividade. “É importante enxergar que há benefícios em fazer essa reorganização.” Segundo a professora do Insper, o comprometimento com uma estrutura mais enxuta e com resultados fiscais saudáveis também pode alterar na expectativa do investidor. “Ele pode enxergar o sinal como uma boa intenção do governo de colocar as coisas nos eixos e assim responde aumentando sua participação dentro da sociedade”, explica. Essa dinâmica pode ajudar a alavancar o investimento ao longo do tempo, com impactos mais significativos, no médio e no longo prazo.

 

Para crescer é preciso investir

Tatiana Pinheiro. A economista-chefe do BNP Paribas destaca que se deve amplificar o investimento capital do setor privado nas várias frentes de infraestrutura no Brasil, como rodovias, ferrovias, energia elétrica, portos e aeroportos.

Celina Ramalho. Para a professora da FGV, investir em energia e transportes é um caminho importante. Ela diz, ainda, que é preciso identificar falhas de mercado, como as regras do setor público que engessam a possibilidade de novos entrantes no mercado, para que se consiga um vigor melhor para a economia.

 

Piti RealiCelina Ramalho, economista professora da Fundação Getúlio Vargas
Celina Ramalho, economista e professora da Fundação Getúlio Vargas, afirma que as últimas projeções do Boletim Focus indicam uma promoção de investimentos no lado real da economia

 

Com os sinais de melhora, a aumento da confiança

Juliana Inhasz. A confiança está ainda muito sensível à situação econômica, explica a professora do Insper. Apesar da expectativa de crescimento, existe uma cautela que tem impactos negativos na recuperação. “Ninguém aposta, não tem produção e as pessoas não consomem. Trata-se de uma questão ainda muito vulnerável”, afirma. Juliana acredita que se as medidas que o próximo governo tem apresentado forem realmente efetivadas, como a adequação aos resultados fiscais, pode-se enxergar uma mudança mais sensível na confiança do consumidor e da indústria. Um cenário de retomada um pouco maior também causaria um aquecimento do mercado financeiro. Segundo Juliana, durante o período de recessão econômica, as empresas tiveram uma posição mais contida, por causa do risco de desvalorização. Assim, a recuperação econômica, ainda que lenta, deve levar a aumentos de demanda. “Se as empresas precisarem produzir mais, haverá uma necessidade de capital para fazer essas expansões. Nesse sentido, acho que as alternativas de abertura de capital são extremamente positivas”, diz.

Cida Damasco. A colunista destaca que um alívio do desemprego será crucial da retomada de confiança do consumidor. Já com relação à indústria, a confiança depende de estímulos que forem providenciados pelo governo e principalmente que o setor industrial não perceba a tentativa de medidas mais limitadoras do crescimento. “É fundamental que haja um diálogo entre o presidente, sua equipe econômica e as lideranças do setor industrial”, destaca.

Celina Ramalho. De acordo com a economista, é previsto que a Bolsa de Valores esteja em outro patamar de movimentação em 2019, seguindo a tendência de elevação do volume de negociações que teve início neste ano. Celina menciona que a revisão para expectativa da Selic de 2019 para baixo da Selic, de 8% para 7,5%, no último boletim Focus – relatório de projeções do mercado publicado semanalmente – sinaliza a promoção de investimentos no lado real da economia. Segundo Celina, uma perspectiva de mais produção no próximo ano requer captação de recursos. Como as Ofertas Públicas Iniciais (IPOs, em inglês), momento em que a empresa abre seu capital na Bolsa de Valores, são o meio para isso, a bolsa deve operar um volume mais favorável no próximo ano.